O governo gaúcho, por meio da Secretaria da Segurança Pública (SSP) e da Polícia Civil, deve providências efetivas para dar um suporte adequado às vítimas de violência doméstica que procuram as Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (Deams). São desconcertantes as informações publicadas pela repórter Adriana Irion nos últimos dias mostrando a demora para registros de ocorrência devido à falta de pessoal. É um tormento que leva inclusive à desistência da formalização da queixa contra agressores. O caso fica mais grave por não serem deficiências novas. Foram tratadas em reportagem há um ano, quando resultaram na promessa veemente das autoridades de que seriam sanadas. Não foram.
Se o combate à violência doméstica é mesmo prioridade, espera-se que desta vez medidas sejam anunciadas e cumpridas
A primeira reportagem, publicada na terça-feira, relata o caso de uma vítima que se deslocou à 1ª Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (1ª Deam), no Palácio da Polícia, em Porto Alegre, e devido ao efetivo insuficiente só foi atendida após mais de oito horas de espera. Isso ocorreu na quinta-feira da semana passada, no mesmo dia em que a cúpula da SSP e da Polícia Civil anunciava a possibilidade de mulheres sob ameaça fazerem denúncias online como forma de ter agilizado o pedido de medida protetiva ao Judiciário. O lançamento da ferramenta foi antecipado devido ao surto de feminicídios próximo à Páscoa. Em apenas cinco dias, 10 mulheres foram assassinadas no Estado.
Mas mais aterrador é o dado que veio a público nesta quarta-feira e consta em um processo administrativo interno. Entre fevereiro e abril deste ano, 307 mulheres desistiram de registrar boletim de ocorrência no plantão da 1ª Deam pela grande espera a que foram submetidas. É um número altíssimo, ainda mais para a estrutura criada para ser exemplar como porta de entrada de vítimas em busca de proteção no Rio Grande do Sul.
No ano passado, 87% das mulheres assassinadas por questão de gênero no Estado não tinham medida protetiva e, na maior parte dos casos, inexistia queixa formalizada contra o opressor. A medida protetiva, que prevê, por exemplo, a determinação para o agressor não se aproximar da vítima, é um anteparo com comprovada eficácia para evitar um desfecho fatal. Mas o ponto de partida é o boletim de ocorrência.
Alerta-se, há bastante tempo, sobre a necessidade de mulheres, sob qualquer tipo de agressão, serem encorajadas a denunciar a situação vivida. Não há como tolerar, portanto, que enquanto o próprio Estado incentiva a procura por ajuda ao mesmo tempo não consegue atender essas mulheres. Isso faz com que, ao cabo, sigam desprotegidas e mais expostas a riscos. São situações que a ferramenta online não soluciona. Os pedidos urgentes que chegam de forma virtual são analisados pelos mesmos agentes do atendimento presencial.
Se o quadro é precário na principal delegacia do gênero no Estado, por certo também deixa a desejar nas demais 22. A 2ª Deam, que atende as zonas leste e norte da Capital, só funciona em horário comercial. Uma lei de 2023 determina que todas essas unidades especializadas fiquem abertas 24 horas por dia, inclusive em feriados e fins de semana. Se o combate à violência doméstica é mesmo prioridade, como o Piratini sustenta, espera-se que desta vez medidas sejam anunciadas e cumpridas.