Celebrada pelo governo e por lideranças parlamentares como um avanço histórico, a reforma tributária aprovada pelo Congresso em dezembro do ano passado começou a ganhar sentido prático na última quinta-feira, com a sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à lei que regula o funcionamento do novo Imposto sobre Valor Agregado (IVA). O tributo englobará dois tipos de cobrança: a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), que é considerada o IVA federal; e o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), o IVA de Estados e municípios. Eles substituirão cinco tributos atuais que incidem sobre o consumo dos brasileiros e que estão embutidos no preço dos produtos: IPI, PIS/Cofins, ICMS e ISS.
O sistema tributário brasileiro, apelidado sintomaticamente de manicômio tributário, ainda é considerado um dos principais entraves ao desenvolvimento econômico da nação
Para os contribuintes, mais importante do que decorar o significado das novas siglas é saber se elas representarão na prática o espírito da reforma, que prevê unificação de tributos, simplificação da legislação, redução da burocracia e da insegurança jurídica, não cumulatividade e desoneração total de investimentos e de exportações. O sistema tributário brasileiro, apelidado sintomaticamente de manicômio tributário, ainda é considerado um dos principais entraves ao desenvolvimento econômico da nação.
No Brasil, os impostos sobre o consumo equivalem a 70% da arrecadação. Nosso país tem a maior carga tributária do mundo em impostos invisíveis, o que leva à injustiça e à desigualdade, pois quem ganha menos acaba contribuindo com um percentual relativamente maior do que pagam os mais ricos. Além disso, a complexidade do sistema tributário é geradora de insegurança jurídica e acaba também estimulando a sonegação.
A atual reforma tributária, vista como grande conquista pelo governo devido à superação de resistências políticas históricas para sua aprovação, pode realmente ser considerada um avanço, mas precisa ser vista com pragmatismo pela população. Em primeiro lugar, não muda nada do dia para a noite. Pelo contrário, sua implementação será lenta, gradual e condicionada à testagem das alíquotas que incidirão sobre cada produto. As mudanças efetivas na tributação só começarão em 2029, com a implantação da redução gradual do ICMS e do ISS sobre os produtos de consumo.
Por enquanto, a maior expectativa recai sobre a futura alíquota-padrão do novo IVA, que será anunciada pelo governo nos próximos dias. Se confirmada a previsão feita pelo secretário extraordinário da reforma tributária, Bernard Appy, poderá ficar em 28% — o que seria a maior alíquota de Imposto sobre Valor Agregado em todo o mundo, de acordo com o ranking da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Não se pode dizer que é um bom começo. Em compensação, este primeiro regramento da reforma tributária, que ainda será revisado pelo Congresso devido aos vetos presidenciais, inclui a isenção total de impostos para alimentos essenciais da cesta básica nacional e 60% de redução da alíquota-padrão para outros itens — benefícios inquestionáveis para a parcela menos favorecida da população.
Em resumo, a reforma aprovada depois de 30 anos de debates ainda não é perfeita. Precisa ser aperfeiçoada. Mas é um passo institucional importante para a justiça tributária e para o aumento da competitividade no país.