Chocou o país nesta semana o caso da menina Sarah Raíssa Pereira de Castro, de apenas oito anos, moradora do Distrito Federal. Ela morreu no domingo depois de inalar desodorante, estimulada por um desafio viralizado em rede social. Não foi o único caso recente. Há pouco mais de um mês, Brenda Sophia Melo de Santana, de apenas 11 anos, de Bom Jardim (PE), perdeu a vida da mesma forma.
São episódios que voltam a demonstrar a premência da regulamentação das redes sociais e outras plataformas digitais no país
Também despertou atenção na terça-feira a Operação Adolescência Segura, da Polícia Civil do Rio, voltada a combater crimes cometidos contra crianças e adolescentes em plataformas online. A ofensiva ocorreu em sete Estados, inclusive no Rio Grande do Sul. Dois adultos foram presos e sete menores acabaram apreendidos. No ambiente virtual, faziam apologia ao nazismo, incentivavam a violência contra moradores de rua e maus-tratos a animais e instigavam a automutilação e o suicídio. O delegado responsável pela investigação cita cerca de 50 crianças e adolescentes mortos nos últimos anos, vitimados pelo incentivo a práticas perigosas travestidas de brincadeiras que circulam sem controle pela internet.
São episódios que voltam a demonstrar a premência da regulamentação das redes sociais e outras plataformas digitais no país, para que tenham maior responsabilidade e cuidado com conteúdos danosos que veiculam. A todo momento surgem casos de informações fraudulentas, mensagens de ódio e estímulo à violência que ultrapassam os limites virtuais e acabam com consequências nefastas no mundo real, para indivíduos e para a coletividade. É lamentável que a Câmara dos Deputados, diante de reiterados motivos para enfrentar o tema, continue se omitindo. O chamado PL das Fake News, aprovado em 2020 no Senado, foi engavetado no ano passado pelo então presidente da Câmara, Arthur Lira, que prometeu e não cumpriu retomar a discussão. O andamento do PL travou inclusive por desinformação disseminada sobre o texto, junto ao lobby das big techs em Brasília.
Fariam bem os deputados se, em um lampejo de conexão com a realidade, deixassem de procrastinar e enfrentassem esse tema, pela importância que tem. Nota-se, no entanto, desperdício de tempo e energia com o descabido projeto de anistia aos envolvidos nos atos golpistas do 8 de janeiro de 2023. Essa não é uma pauta que mereça prioridade do Congresso.
O parlamento, aliás, deve trabalho em 2025. A matéria votada mais relevante foi o orçamento da União deste ano _ que, na verdade, deveria ter sido tratada no final de 2024. Depois, apreciou de forma célere a Lei da Reciprocidade, uma rara convergência entre governo e oposição, voltada a responder à guerra comercial desencadeada pelos EUA. Outros assuntos importantes, porém, não têm o avanço esperado.
O presidente da Câmara, Hugo Motta, é o retrato dessa apatia. Com apenas dois meses e meio no cargo, curte férias no Exterior e retorna ao batente apenas após a Páscoa. Caso os deputados continuem a negligenciar o tema, aguarda-se que as regras que gerem a responsabilização das grandes plataformas venham pelo Supremo Tribunal Federal (STF), com a retomada do julgamento sobre a constitucionalidade do Artigo 19 do marco civil da internet.