Nos últimos 20 dias, foram noticiados ao menos quatro desdobramentos de apurações da Polícia Federal (PF) sobre crimes ligados à recente eleição municipal no Rio Grande do Sul. São casos que foram denunciados em reportagens do Grupo de Investigação (GDI) da RBS em dezembro e janeiro. Em regra, ocorreram em pequenas cidades. São episódios de possíveis compra de votos, transferências irregulares de títulos de eleitor mediante suborno para inflar a votação de determinadas candidaturas e até de provável envolvimento com facções criminosas. Políticos com mandatos nos Executivos e Legislativos e postulantes a cargos públicos foram alvo de operações de busca e apreensão, acabaram presos preventivamente ou indiciados.
Quem pratica um ato de corrupção que parece pequeno e permanece impune tende a se encorajar a malfeitos maiores
É essencial que autoridades dediquem atenção a indícios de irregularidades do gênero, independentemente do porte da comunidade. Os pequenos municípios, aliás, são a maioria no Rio Grande do Sul. Mais de dois terços têm uma população inferior a 10 mil habitantes, segundo dados do Censo Demográfico de 2022 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A população dessas cidades, da mesma maneira que a das maiores, merece ter eleições justas e limpas e que se atente para a vontade legítima do eleitor prevalecer, sem fraudes de qualquer ordem.
Não se deve aceitar a desculpa de que é uma prática corriqueira e que, em regra, não gera consequências. O fato de a PF estar reagindo às denúncias, muitas com provas fartas, como mensagens em aplicativos de mensagem, comprovantes de pagamento por Pix e vídeos de acertos, traz inúmeros benefícios. Em primeiro lugar, a própria punição aos envolvidos, caso a culpa reste provada, após julgamento. As cidades, dessa forma, se livram de agentes públicos ímprobos. A publicidade das investigações, indiciamentos e prisões também tem um efeito pedagógico de desestimular práticas semelhantes nestes e nos demais municípios. É preciso demonstrar que a impunidade não é uma regra e crimes geram consequências.
A corrupção, uma chaga que parece incurável no país, não se limita aos altos escalões do poder nem ao desvio de bilhões de reais. A grande maioria dos políticos não inicia sua carreira em posições de destaque. Os primeiros passos são dados em cargos menores, não raro em municípios de pequeno porte, para depois ascender ao longo do tempo. Quem pratica um ato de corrupção que parece pequeno e permanece impune tende a se encorajar a malfeitos maiores no decorrer de sua trajetória. Abreviar a carreira de indivíduos sem ética, cortando um mal pela raiz, é um bom serviço prestado à sociedade brasileira. É uma tarefa em que a imprensa, ao jogar luz sobre esses casos, desempenha um relevante papel.
Já foi registrado que PF e Ministério Público Eleitoral (MPE) contabilizaram no ano passado um crescimento significativo de episódios investigados na comparação com a eleição de 2020. Em dezembro do ano passado, a Polícia Federal já tinha indiciado por crimes eleitorais 76 pessoas, ante somente nove em 2020. É mais uma razão para reforçar que as instituições estão atentas a irregularidades. São crimes contra a democracia, pouco importa se cometidos em capitais ou pequenos municípios.