Tragédias como a que ocorreu neste domingo, em Gramado, com a queda do avião que dilacerou uma família, causam grande consternação e impõem, em um primeiro momento, prestar condolências às pessoas mais próximas das vítimas, dar amparo aos feridos e o início de uma investigação rigorosa para apurar as causas do desastre. Ainda assim, cabe uma reflexão a partir das pistas disponíveis acerca das razões que teriam levado ao acidente. Os primeiros indícios apontam para uma imprudência facilitada por normas mal fiscalizadas.
Ao que se sabe o aeroporto de Canela estava tecnicamente fechado, situação em que decolar seria uma infração
Sabe-se que a aeronave de pequeno porte decolou sob condições meteorológicas adversas causadas por uma intensa neblina, do aeroporto da vizinha Canela, em direção a Jundiaí (SP). Minutos depois se chocou com um prédio, uma casa e uma loja de móveis, próximos à Avenida das Hortênsias. Destroços atingiram uma pousada, repleta de hóspedes. Morreram 10 pessoas da família do empresário Luiz Cláudio Galeazzi, proprietário e piloto do avião. Poderia ter sido uma catástrofe maior. A poucos metros do local, há um posto de combustíveis. A região é de trânsito intenso e alta circulação de pessoas, ainda mais no período do Natal, época de maior afluxo de turistas para Gramado.
As circunstâncias do acontecido ainda serão devidamente apuradas pelo Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa), órgão da Aeronáutica responsável por desvendar os fatores que contribuíram para desastres aéreos e fazer recomendações de segurança para evitá-los. Ainda que exista a necessidade de cautela, a opinião de especialistas em segurança de voo indica que o piloto parece ter assumido o risco de decolar mesmo com a ausência de visibilidade horizontal e de teto. O aeroporto de Canela não conta com torre de controle, que poderia avaliar as condições meteorológicas do momento e conceder ou negar a autorização para o voo. Na prática, nos demais casos a decisão do que fazer é do piloto. Ainda assim, ao que se sabe o aeroporto estaria tecnicamente fechado. Nessa situação, pelas normativas vigentes, decolar seria uma infração.
No Estado, apenas Porto Alegre e Santa Maria têm torre de controle. Como outros terminais maiores no RS não dispõem desse monitoramento, é difícil que Canela venha a ter. Na maioria dos aeroportos gaúchos, fia-se na responsabilidade do piloto, que sabe estar infringindo normas se decide decolar sem as condições mínimas de visibilidade. É irregularidade passível de multa. Mas depende de denúncia e de comprovação do fato para ser aplicada. Torna-se uma absurda brecha para a irresponsabilidade. Seria necessário, portanto, encontrar formas de tornar esse controle mais rigoroso. Como cabe ao Cenipa fazer recomendações a partir das investigações que conduz, faria bem se sugerisse novas regras que inibissem atitudes semelhantes _ mesmo que essa não tenha sido, ao final, a causa ou uma das razões para o acidente.
Administrado pela Infraero, o Aeroporto das Hortênsias, em Canela, recebeu melhorias e ampliações, entregues no início do mês. É inequívoco que uma das regiões mais turísticas do país necessita de um aeroporto melhor e mais seguro, até para desafogar o acesso por estradas. Impulsionaria ainda mais a economia da Serra, que nesse momento se recupera dos impactos da enchente de maio e tem agora o desafio superar também a tragédia deste domingo.