O gráfico acima mostra a projeção do Ministério do Planejamento - portanto, do próprio governo - para a trajetória da dívida pública líquida em relação ao PIB. Como a coluna já observou, piora antes de melhorar.
Diante desse cenário que ajudou a azedar o humor do mercado, aumentou a pressão para que o governo Lula admita fazer o ajuste fiscal também pelo corte de gastos. É bom lembrar que parte da acidez vem lá de fora, tanto no adiamento do corte de juro nos Estados Unidos e do aumento do risco de ampliação do conflito no Oriente Médio.
Relatório do Fundo Monetário Internacional (FMI) sobre políticas fiscais em todo o mundo projeta que a dívida bruta (sem descontar o que o país tem a recebe, como faz o indicador do Planejamento), chegue a 93,9% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2029 - as estimativas alcançam no máximo os próximos cinco anos.
Outro estudo, a Instituição Fiscal Independente (IFI) alerta que a alteração, "no mínimo, posterga a convergência para uma trajetória de estancamento do crescimento da dívida pública". Em português: adia a desejada redução do peso do endividamento.
O FMI apontou a importância de fazer "esforço mais ambicioso" para que o Brasil consiga começar a reduzir a dívida. A IFI prevê que, para estabilizar - não reduzir - a dívida bruta seria necessário superávit anual de 1,5% do PIB. Marcus Pestana, diretor-executivo da entidade, avalia que ainda há dúvida sobre a possibilidade de alcançar déficit zero neste ano. mesmo considerando a margem de tolerância de 0,25% do PIB.
Não, o Brasil não deve nada ao FMI, que foi "expulso" do Brasil por Paulo Guedes, ministro da Economia do governo Bolsonaro, por apontar problemas nas contas. Então, não tem nada especificamente contra Lula. Apenas segue desempenhando o mesmo papel de sempre, de apontar riscos à estabilidade. E também não, a IFI não é uma entidade dominada por rentistas que querem manter juro alto para ganhar dinheiro fácil.
Depois que o presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, avisou que nem o único corte de juro que era dado como certo está garantido, esta foi a reação de Fernando Haddad, ministro da Fazenda do governo Lula:
— Como disse o Roberto (Campos Neto), é um momento agora em que essas placas tectônicas estão se acomodando e temos que ter um pouco de cautela para saber quando é que isso vai parar.
É preciso cautela porque o juro ainda alto contribui para aumentar a dívida, em boa parte atrelada à Selic. Se houvesse novos cortes, ajudariam a aliviar esse peso. Mas agora, com incerteza externa e interna, já não se sabe quando - e se - vai voltar a cair. Como alertou a IFI, inconstância na meta "pode influenciar a formação de expectativas de investidores e agentes econômicos relevantes em relação à política fiscal brasileira e suas múltiplas consequências".