Os cards de final de ano magoaram o ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Em entrevista ao jornal O Globo, reclamou que líderes do PT festejaram os bons resultados na economia em 2023 mas sequer corrigiram uma acusação que o contrariou, a de "austericida".
Antes de prosseguir, a explicação: austericídio foi um termo usado em um documento do PT no ano passado para definir um suicídio político por meio da prática da austeridade - algo que, definitivamente, não se aplica a Haddad, ao menos não ao pé da letra.
Como a coluna já observou, embora exista um curioso - e único - ponto em comum entre Haddad e o novo presidente da Argentina, Javier Milei, que é o esforço de mostrar que políticas públicas não crescem em árvores, custam dinheiro que não é apenas "público", vem do bolso do contribuinte. Daí a ser austericida, existe um abismo, que parece não ser percebido por correntes petistas que ainda não processaram a relação de causa e consequência entre o excesso de gastos do passado e a crise econômica que o sucedeu.
No mercado e em muitos meios privados, Haddad é criticado exatamente pelo oposto: ter baseado o ajuste fiscal em aumento de receita, em vez de aceitar maiores cortes de despesas - a não ser o custo tributário. Foi quem que ajudou a diluir os efeitos negativos da declaração do presidente Luiz Inácio Lula da Silva sobre a "desnecessidade" do déficit zero neste ano.
Alguns dos bons resultados da economia em 2023 não se devem ao Ministério da Fazenda, especialmente no mercado financeiro, que ficou quase todo o ano monitorando os sinais de alta e baixa no juro nos Estados Unidos. Mas é preciso creditar, sim, a Haddad, a moderação das pressões por corte radical de despesas por parte da iniciativa privada e por mais gastos da ala mais política do governo, a conciliação com o Banco Central (BC) e a aprovação de várias medidas no Congresso, obtida com seu engajamento pessoal na articulação.
Depois da queixa do ministro, a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, até tentou contemporizar. Disse não ser verdade que "a resolução (do PT) diz que está tudo errado e tem que mudar tudo (...), muito pelo contrário". Mas voltou a afirmar que o partido está preocupado com o fato de que "o arcabouço somado ao déficit zero vai diminuir muito o papel do Estado no desenvolvimento da economia". Como disse Haddad no final de 2023, muita gente "largou mão" de fazer conta.
O que é déficit zero e por que é importante
A meta de déficit zero adotada pelo Brasil é um compromisso relacionado ao chamado "resultado primário". Isso quer dizer que o governo não vai gastar mais do que arrecada, sem considerar as despesas com a dívida pública. Significa que, ao não comprometer recursos que não tem (o que significa, na prática, gastar mais do que arrecada), não vai aumentar a dívida do Brasil. Ter déficit zero representa disposição de não elevar o já pesado endividamento público. Quanto maior a dívida, maior seu custo, o que dificulta a redução do juro.