O debate está nas redes sociais, na imprensa, em Brasília: o presidente Jair Bolsonaro pode ser o terceiro a sofrer impeachment em pouco mais de três décadas? A lista de possíveis crimes de responsabilidade, que justificariam a abertura do processo, não para de crescer: a mais recente (bem embasada) a que a coluna teve acesso enumerava 23.
Para um pedido prosperar, são necessárias três condições: apoio parlamentar, como detalhou a colega Rosane de Oliveira (clique aqui para ler) e protestos populares, como apontou o colega Paulo Germano (clique aqui para ler), além da adesão do poder econômico, fundamental nas derrubadas de Fernando Collor de Mello e Dilma Rousseff.
Desde o episódio da facada na campanha eleitoral, quando a bolsa subiu diante da maior probabilidade de vitória do então candidato do PSL, a sustentação do poder econômico a Bolsonaro ficou evidente. Acima de tudo por representar o antipetismo, mas também pelo discurso do guru econômico Paulo Guedes. Até agora, eram raros os empresários que ousavam criticar o "mito" ante seus pares, muito menos em público. Durante quase dois anos, o apoio foi quase unânime. Segue majoritário, mas começa a dar sinais de inflexão, ainda tênues.
Em live do jornal Valor Econômico, o ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga, muito respeitado no setor privado, afirmou que o presidente Jair Bolsonaro já perdeu apoio de parte do empresariado. E justificou:
– É intolerável que crimes de responsabilidade ocorram a toda hora.
Segundo Armínio, nos grupos de discussão dos pesos-pesados do PIB, o assunto está mais quente do que aparece em público. Disse que "entidades empresariais têm lideranças historicamente atrasadas", mas na base há percepção de que é preciso começar a se engajar. Avalia que o "medo de falar" vem da esperança de cumprimento da prometida agenda liberal para a economia, mas vê o assunto "esquentando".
A coluna testou a tese de Armínio com empresários gaúchos, e obteve a mesma medição de temperatura, com um senão: subiu, mas ainda está mais para morna do que para quente. Há dois testes de fogo pela frente: como será a renovação do auxílio emergencial e o estrago adicional que fará nas contas públicas, e se o resultado da eleição na Câmara dos Deputados e no Senado, que se antecipa francamente favorável a Bolsonaro, vai mesmo destravar a agenda de reformas.
Com um aliado na presidência da Câmara, que decide aceitar ou não um pedido de impeachment, Bolsonaro afasta o risco definitivamente? Depende. Se o presidente ameaçar um reequilíbrio fiscal visível no horizonte entre quatro e cinco anos, se cimentar a trava ás reformas e se, acima de tudo, empurrar o Brasil para o desastre total no combate ao coronavírus, o que empresários mais críticos não descartam, o Centrão será fiel a si mesmo e aos donos do dinheiro, não ao mais novo aliado.