Neste 3 de maio, quando se celebra o Dia Mundial da Liberdade de Imprensa, é bom lembrar que toda essa discussão no STF e alhures sobre regulação das mídias sociais poderia ser tratada, sem censura ou tortuosas ameaças de controle estatal, com uma medida prática e um conceito básico.
A medida: as plataformas, como qualquer empresa que faz negócios no Brasil, passam a cumprir a Constituição brasileira. O artigo 5, inciso IV, que é a síntese da defesa da liberdade de expressão, diz textualmente: “É livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato”. Por conveniência, as big techs só levam em consideração a primeira parte da frase, mas é depois da vírgula que está a chave para se aplacar as aberrações das redes sociais.
Ao proibir o anonimato, os constituintes fixaram sabiamente que somos livres para nos expressarmos, mas não pode haver – salvo exceções em lei, como paródias – manifestações anônimas, exatamente porque, em caso de abuso, todos podemos ser responsabilizados. E que restrições são essas? Nada de novo. Eu as aprendi nos primeiros anos de faculdade de jornalismo, e lá se vão uns 45 anos, quando nem se cogitava de internet. São os artigos 138, 139 e 140 do Código Penal, os conhecidos calúnia, difamação e injúria, que valem para qualquer cidadão e abarcam a maioria das baixarias nas redes sociais.
Aplique-se a Constituição às plataformas, pois, e elas terão de limpar a sujeira dos robôs e de suas contas falsas e anônimas, por onde verte boa parte do esgoto digital. De quebra, teremos uma sanitização adicional nas fraudes dos cliques artificiais em anúncios e dos seguidores de mentirinha. Todo mundo, menos quem fatura com as contas fakes, naturalmente, sairá ganhando.
Agora ao conceito. Um supermercado que vende alimento vencido e intoxica seus consumidores não pode alegar que não tem responsabilidade porque é apenas um intermediário – como, aliás, fazem algumas big techs quando lavam as mãos sobre fraudes e abusos em conteúdos impulsionados, ou seja, sobre como acumulam fortunas.
A responsabilização das plataformas pela forma como fazem dinheiro poderia se chamar Lei Drauzio Varella. Há alguns dias, o respeitado e popular médico desabafou em artigo na Folha de S.Paulo que a Meta, dona do Facebook e do Instagram, se omite descaradamente sobre as quadrilhas que usam sua imagem e voz recriada com inteligência artificial para enganar incautos com propagandas de tratamentos tão miraculosos quanto inúteis.
Em qualquer atividade, o ideal seria a autorregulação, mas quando empresas se negam a cumprir preceitos éticos mínimos, é hora de, em benefício final dos usuários e consumidores enganados, retirar o certificado de isenção concedido ingenuamente às big techs.