
Em geral associado ao frevo, a multidões em festa, praia e desigualdade social, Recife poderia ser apenas mais um desses estereótipos do nordeste brasileiro. A capital pernambucana, porém, tem lições a ensinar mesmo a metrópoles que se consideram na vanguarda do desenvolvimento.
A transformação de Recife começou há cerca de duas décadas e meia, com a criação do Porto Digital, um distrito de tecnologia e inovação que se espalha por 171 hectares do que era antes uma área degradada da cidade histórica. Desde lá, o parque tecnológico já estimulou a restauração de 138 mil metros quadrados de prédios antigos, convertidos em empresas inovadoras, restaurantes, hotéis e centros culturais.
O Porto Digital e sua cascata de benefícios sociais e econômicos é a melhor justificativa para que outras capitais, entre elas Porto Alegre, criem e consolidem parques tecnológicos capazes de reverter tendências de estagnação. Mas, por si só, eles não respondem por toda a transformação da cidade.
No caso de Recife, sobressai um fenômeno de popularidade, o jovem prefeito João Campos, do PSB, reeleito em 2024 com 78,11% dos votos, um recorde nas capitais. Filho do ex-governador Eduardo Campos, candidato a presidente morto num acidente aéreo, João Campos é descrito por adversários como um rei do marketing. De fato, o prefeito de 31 anos entende como poucos políticos a linguagem das redes. No Instagram, ele surfa em 3 milhões de seguidores, quase o dobro de seu congênere em São Paulo, Ricardo Nunes. João Campos usa nas redes uma linguagem informal, repleta de memes, e toma emprestada a popularidade de celebridades da periferia, como influenciadores do bregafunk.
A estratégia, contudo, está longe de explicar todo o alcance do sucesso do prefeito. Primeiro, ele governa a cidade com um arco ideológico que vai do PT ao União Brasil. Mais relevante é a máquina de obras municipais. Em um só programa, que doa projetos de engenharia e material, enquanto a comunidade entra com a mão de obra, são tocadas 1,6 mil pequenas obras que livram a população de tormentos que pareciam eternos. A cidade toda é um canteiro de obras públicas, somadas a investimentos privados que apostam no futuro de Recife como centro econômico.
A prefeitura é, ela própria, um centro de tecnologia, com plataformas que fazem quase de tudo, da intermediação de vagas de emprego à adoção de cães e gatos. Nas ruas, totens com 500 câmeras são armas para enfrentar a criminalidade, uma chaga exposta de Recife, e, na orla, banheiros bem cuidados surpreendem visitantes. Por todo lado, Recife expõe o potencial transformador de visões novas para um mundo novo. É bom prestar atenção.