
"O bom médico precisa antes ser uma pessoa boa" (Mario Rigatto)
Há consciência de que a prática médica submetida a múltiplos fatores negativos tem perdido nos últimos tempos o senso de humanização, e que essa perda tem fragilizado a relação com os pacientes. Tal reconhecimento tem despertado, com algum atraso, a reação das melhores faculdades de Medicina para a introdução de disciplinas de humanidades nos seus currículos.
Essas escolas felizmente perceberam que a formação de profissionais exclusivamente técnicos não conseguirá produzir mais do que autômatos, que serão muito brevemente atropelados pelo robô, porque, equiparados à máquina pela rigidez afetiva, serão fragorosamente derrotados por ela como banco de dados invencível.
Na última sessão de um dos mais longevos programas de humanidades na saúde, o do Hospital Samaritano do Rio de Janeiro, criação do venerável Ricardo Cruz, se discutiu justamente a formação de médicos humanistas.
Quando o debate abordou em que grau devemos nos envolver com o sofrimento dos pacientes, coloquei minha opinião de que o verdadeiro médico não disfarça sentimentos, porque trabalhando com uma ciência biológica que não obedece a nenhum modelo matemático, nós erramos muito, e a única chance que temos de tentar nos redimir é permitir que as pessoas percebam o quanto ficamos mal quando isso acontece.
Há consciência de que a prática médica submetida a múltiplos fatores negativos tem perdido nos últimos tempos o senso de humanização
Essa afirmação suscitou uma questão desafiadora: e o que é o verdadeiro médico?
As respostas a esta pergunta fora do roteiro original acabaram, na minha opinião, entregando pela improvisação a essência do que cada um dos participantes tem de melhor. E ficou evidente que a bagagem que eles acumularam em tempos diferentes de prática médica é inspiradora:
"O médico de verdade é o que oferece ao paciente, naquela circunstância sofrida, o que ele gostaria de receber para si, ou para os seus amados, quando adoecessem."
"Ou é aquele que desperta confiança no paciente, garantindo-lhe que, em qualquer circunstância, o doutor saberá o que é melhor para ele, mesmo quando não houver mais do que consolo a oferecer."
"O verdadeiro médico é o que está junto, o tempo todo. E os jovens precisam entender que é um grande privilégio para o médico estar junto do seu paciente nas jornadas mais diversas e compartilhar angústia, expectativa, medo, esperança, tristeza e felicidade. Cada vez mais as pessoas querem isso: alguém que esteja junto delas em todos os momentos."
Poucas vezes, quando uma reunião terminou, eu lamentei tanto que o tempo tivesse encerrado.
Mas foi só quando me propus a escrever uma crônica contando daquela reunião que me dei conta de que nada de completamente original tinha sido dito, mas havia uma tal força na reafirmação das nossas crenças que voltei a trabalhar com a certeza renovada de que é possível, sim, ser um verdadeiro médico. E que maravilha não ter nenhuma dúvida do quanto isso vale a pena.