
A polêmica da semana nas redes sociais é a nomeação do pastor evangélico Lacir Ramos para um cargo de confiança na Secretaria de Justiça e Sistemas Penal e Socioeducativo, no Rio Grande do Sul. É que, antes de abraçar a causa de Deus, Lacir seguiu intensa trajetória no crime. Sob a alcunha Folharada, assaltou e matou, inclusive policiais. Teve atuação nacional. Foi preso duas vezes pelo delegado Cleber Ferreira, uma em São Paulo, outra no Rio de Janeiro. Após cumprir grande parte de uma pena superior a 200 anos de cadeia, se converteu aos cultos.
Folharada é um sujeito simpático, de aperto de mão firme. O conheci em meados dos Anos 2000, quando fazia batismos de apenados nas águas do Rio Jacuí, junto às penitenciárias de Charqueadas. Muitos juram que renasceram para a vida e abandonaram as armas depois desses batizados. Não tenho motivos para duvidar. Desde essa época não existem novos crimes atribuídos ao ex-bandido, hoje pastor Lacir. Até mesmo lideranças do sindicato dos servidores penitenciários (Amapergs-Sindicato) admitem que nada consta, recentemente, contra o criminoso arrependido.
A reticência, inclusive por mensagens que recebi, é quanto ao tipo de função que Folharada vai exercer. É possível que ele tenha acesso a sistemas de informações estratégicas. Assunto delicado, mesmo. Até porque em concurso público, a vida pregressa do candidato conta muito (embora Folharada almeje um Cargo de Confiança). Mas o secretário Ronaldo Nogueira, do Trabalho, confia no homem e o indicou. Talvez seja o caso de deixar nas mãos dele o bônus e o ônus da escolha. Se der errado, tudo com ele.
O episódio é importante para refletir sobre regeneração. É difícil, porque as tentações do crime são muitas para quem nele já ingressou. Às vezes o sujeito quer se ressocializar e os companheiros de quadrilha reaparecem, para seduzi-lo com propostas milionárias ou até obrigá-lo a retornar à “vida loka’. Outro problemaço é que a sociedade é avessa a ex-detentos. Não confia. Não estimula seu retorno ao mercado de trabalho, com exceções.
Em raros casos, com persistência, a ressocialização acontece. No Distrito Federal, mãos que um dia empunharam armas hoje se dedicam a carregar livros. Ex-detentos criaram em 2017 um clube de leitura. Nas sessões de bate-papo, discutem obras como Crime e Castigo (do russo Fiódor Dostoievsky) ou Os Miseráveis (do francês Victor Hugo). Temas calcados na vida de prisioneiros. Voltarão a cometer crimes? Não tenho bola de cristal. Só sei que tentam sair do inferno que eles próprios criaram.