Fronteira. É de lá que vêm cocaína, maconha, crack e armas pesadas que abastecem as facções que infernizam as grandes e médias cidades brasileiras. O Brasil divide 16 mil quilômetros de terras, lagos e rios com seus vizinhos, a maioria de língua espanhola. O que fazer para conter a avalanche de ilegalidades proveniente do Exterior?
Esse é um dos maiores desafios do presidente eleito, Jair Bolsonaro. E parte das respostas pode estar num livro, a ser lançado em dezembro: Controle de Fronteiras no Brasil, do delegado federal Rafael Francisco França, atual delegado Regional Executivo no Estado do Acre. A obra (publicada pela Editora Novo Século e com 347 páginas) é a compilação da sua tese de doutorado no Programa de Pós-Graduação em Estudos Estratégicos Internacionais da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
França, que atuou muito tempo no Rio Grande do Sul, é um especialista no tema. É membro do International Visitor Leadership Program, programa do Departamento de Estado norte-americano, e foi bolsista no Centre for International and Defence Policy, vinculado a Queen´s University, em Kingston, Canadá. Saiu de Bagé para ser um dos homens-fortes da PF no Acre.
O livro se divide em duas partes. Na primeira, um raio X das carências em vigilância fronteiriça, com estudo de caso das principais áreas no Rio Grande do Sul (Aceguá, Santana do Livramento, Quaraí, Uruguaiana). França admite que fiscalizar é tarefa hercúlea, porque a fronteira é extremamente porosa. As ações repressivas são feitas de maneira sazonal, até porque há crônica carência de efetivos em todas as instituições que fazem parte do sistema gerencial brasileiro para tantos quilômetros a serem fiscalizados.
A falta de gente é driblada com uma política de vantagens pecuniárias ao policial que se dispõe a atuar na faixa fronteiriça, com maior contagem de tempo de serviço e auxílios para moradia e alimentação. O legítimo cobertor curto.
A segunda parte do livro, mais analítica, se dedica a colher sugestões para melhor vigiar o país. A principal constatação é que de nada adianta semear postos de fronteira de fio a pavio. Há, segundo o autor, uma desproporção entre os recursos utilizados para controle migratório e as atividades de investigação criminal e inteligência policial relacionados à repressão de crimes com transposição de fronteiras.
"Mais adequado seria que houvesse um cargo específico para o controle migratório ou ainda a criação de um departamento dentro do Ministério da Justiça somente para o controle migratório e/ou polícia de migração, incluindo expedição e controle de passaportes. Desse modo, a Polícia Federal somente desenvolveria a investigação criminal preliminar", escreve França.
O delegado acredita que o controle de fronteiras deve se dar nas estradas, numa mistura de muita informação coletada e vigilância por amostragem. "Policial não é guarda e nem porteiro", resume um dos entrevistados por França.
O livro também discute a possível criação de uma polícia de fronteira, liberando a Polícia Federal para sua função principal, a investigação. São analisadas várias possibilidades. Uma delas é o uso da Força Nacional de Segurança Pública (FNSP, composta por PMs de elite), que poderia baratear o primeiro impacto orçamentário. Seria necessário aumentar em dez vezes o efetivo, de 1,5 mil para 15 mil policiais.
O uso de uma força já existente livraria o país da burocracia da criação de uma nova instituição dentro da estrutura securitária brasileira, com novos encargos, novos custos e, principalmente, compartilhamento de atribuições antes vinculadas a outros órgãos do mesmo sistema. Mas há quem discorde do uso da FNSP.
E o Exército? Cuidaria da defesa nacional, como é sua missão, não da segurança pública, esclarece França.
Taí um material para o futuro presidente - ou o futuro ministro Sergio Moro, da Justiça - dar uma olhada.