
O deputado federal Arthur Maia (DEM-BA) dedicou mais de três meses de seu trabalho, em 2017, para relatar a proposta de reforma da Previdência do governo de Michel Temer. Quando concluiu o trabalho e o pacote de medidas estava prestes a ser votado, o Palácio do Planalto foi engolfado pela crise política provocada com as gravações de Joesley Batista, dono da JBS.
O apoio político de Temer no Congresso foi pelos ares e o plano de ajustar as regras de aposentadorias teve de ser adiado.
— O momento político agora é mais favorável — diz Maia, que defende a proposta de emenda à Constituição (PEC) do presidente Jair Bolsonaro, mas critica o governo por não ter usado a proposta de Michel Temer que já tramitava na Câmara.
Como o senhor avalia a proposta de reforma da Previdência do governo Bolsonaro?
É muito semelhante àquela que foi apresentada pelo presidente Michel Temer, com poucas mudanças. Não entendi o motivo de Bolsonaro ter deixado de lado aquela PEC que já estava praticamente pronta, sendo que as alterações são muito pequenas. Isso vai custar ao Brasil pelo menos R$ 300 bilhões, porque certamente não será aprovada no primeiro semestre.
Qual a projeção do senhor para a tramitação?
Se conseguirmos avançar para que seja aprovada na Câmara até junho ou julho, será um grande passo. Mas, mesmo assim, em seguida, no Senado, será travada nova discussão, com a possibilidade de os senadores fazerem novas emendas e a PEC ter de retornar à Câmara. Pelo que conheço da Câmara, é muito difícil que passe a desconstitucionalização da Previdência. Hoje, toda a questão previdenciária é tratada no âmbito da Constituição e, para ser modificada, é preciso que haja 308 votos de deputados. Acho muito difícil que seja aprovada a retirada dessa matéria do corpo da Constituição para que outra reforma (no futuro) possa ser feita apenas com maioria simples dos deputados, de 257 votos.
Mas a PEC atual toca em temas que não eram tratados.
Endurece em alguns pontos, mas é uma PEC que tem muito a ver. Há cinco pontos que terão de ser tratados em qualquer reforma constitucional que trate da Previdência. Em primeiro lugar, o estabelecimento de idade mínima, porque não é razoável que no Brasil só o pobre se aposente com 65 anos, enquanto o rico, que pode começar a contribuir mais cedo, se aposenta com 40 e pouco anos, 50 anos. Em segundo lugar, uma regra de transição. Em terceiro, vem a igualdade entre o servidor público e o empregado do setor privado. Isso também existia na outra PEC. Outro ponto é o tratamento diferenciado para policiais e professores. E, por fim, a questão dos trabalhadores rurais. Esses cinco pontos são tratados nas duas propostas, as alterações são pequenas, e ao meu ver, uma nova PEC não se justifica. É fato consumado: o presidente decidiu que deveria ser assim, e ele tem toda condição de fazer isso. Mas isso trará um atraso.
O momento político é mais propício para aprovação?
Parlamentares que agora se dizem defensores da reforma com unhas e dentes eram contra lá atrás. Cabe às pessoas fazer esse julgamento. Mas outra questão é que, na própria sociedade, existe uma noção mais clara da necessidade da reforma. Quando fui relator no governo Temer, encaramos um ambiente muito mais hostil à reforma. Naquele momento, cerca de 95% da população brasileira era contra a reforma. Enfrentar a reforma naquelas condições foi muito penoso. Mas o debate que promovemos serviu para mostrar a muitos brasileiros que estavam abertos ao convencimento e ao debate de maneira justa e real que o país não tem capacidade de manter esse instituto previdenciário que privilegia os ricos e prejudica os pobres. Existe uma realidade muito diferente da que tínhamos dois anos atrás.
Então, se ocorrer, a aprovação da reforma ocorrerá apenas no segundo semestre?
Estamos em fevereiro. Estão falando em instalar as comissões na Câmara na semana que vem, mas não acredito. Acho que, só depois do Carnaval, os líderes vão indicar os nomes. Então, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), que é a primeira comissão por onde a PEC tem de passar, só vai começar a funcionar lá por 15 de março. Vamos supor que lá pelo começo de abril essa PEC transite na CCJ, onde existe possibilidade de obstrução com pedido de vista. Depois, será constituída uma comissão especial que deverá começar a funcionar em meados de abril. Terá de haver as audiências públicas e nunca acontecem mais do que duas por semana. Deverá ser no mínimo entre 15 e 20 audiências. Se projetar 18 audiências, serão necessárias nove semanas, ou seja, dois meses e meio. Então, chega julho, quando tem o recesso parlamentar. Vamos dizer que, lá no começo de agosto, a reforma seja votada na comissão. Enfim, vai para o plenário, onde é preciso duas votações com 308 votos.
A votação seria em agosto?
Se conseguirmos votar em agosto ou até meados de setembro, será um grande avanço. A PEC sairá para o Senado em setembro. E você não vai imaginar que uma reforma da Previdência vá ser aprovada no Senado em menos de dois meses e meio. Aí, chega o final do ano. Se o governo correr muito, conseguirá aprovar em 2019. Isso será uma grande vitória. Mas é preciso que se faça um calendário com muito empenho. É uma previsão fora da realidade a de que a PEC esteja pronta para ser sancionada antes do final do ano.
Qual ponto deverá render mais discussão e que o governo terá mais dificuldade para aprovar?
Será a desconstitucionalização do tema. Mesmo entre os deputados que apoiam a reforma, as pessoas não concordam com essa ideia de tirar a Previdência da Constituição e passar esse tema para ser tratado por lei ordinária. Essa questão é muito difícil, nunca nem sequer foi proposta por nenhum presidente da República. Praticamente todos fizeram reforma: Fernando Henrique, Lula, Dilma. Ninguém propôs que houvesse desconstitucionalização. Não estou dizendo que não será aprovado, mas é um tema muito difícil.
Faz sentido mandar uma proposta agora e outra, mais tarde, que inclui os militares?
É razoável que o governo mande um projeto à parte para tratar dos militares porque a gente está tratando de reforma da Previdência e, atualmente, os militares não têm Previdência. Eles vão para a reserva. Então, tem de se mandar um projeto separado. Agora, acho que o projeto tem de ser mandado logo. Não dá para votar a reforma da Previdência sem que esteja pronto para votar juntamente a reforma dos militares. É muito difícil, ainda mais em um governo com tantos militares, que se convença os deputados a votar a Previdência de todo mundo e deixar os militares de fora. Mas tudo bem que sejam projetos separados, é razoável e necessário.