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Será que o pisca foi suspenso em Porto Alegre?
Será que não estou ciente de alguma alteração no código de trânsito gaudério?
Você está dirigindo de boa, e de repente os veículos vizinhos vão mudando de pista sem avisar, num zigue-zague frenético e intempestivo. Passam da esquerda para a direita, da direita para a esquerda, como se não estivessem acompanhados, como se a cidade se mostrasse deserta, antecipando a solidão das madrugadas nos horários de pico.
Entram numa garagem ou numa rua sem nenhuma advertência, do nada, numa existência viária vazia de sentido.
Parece que todos os motoristas porto-alegrenses decidem de última hora, ou estão perdidos, ou não sabem bem o que fazer nem aonde ir.
Adivinhar as manobras alheias surpreendentes não requer uma direção defensiva, mas blindada.
Você não desgruda um segundo do retrovisor. Pilota mais olhando para o retrovisor do que para frente. As laterais formam seu vidro dianteiro.
Tem que ser médium, para não bater ou colidir com os desatinos imprevidentes.
Não é que o pisca é acionado depois do movimento executado, ele sequer é concedido, numa travessia às cegas.
Às vezes, penso que ingressei em uma autopista de fantasmas. Os ectoplasmas surgem e desaparecem, e é você que está delirando e enxergando vultos.
Para sair de casa, exige-se uma coragem sobrenatural.
Será preguiça de dar a seta?
Eu dou seta até na garagem. Até no momento de estacionar na minha vaga.
Por hábito. Pela força do hábito. Assim como o cinto, que somente desfivelo ao desembarcar.
O pisca se localiza perto do volante para ninguém ter trabalho ao utilizá-lo. Trata-se do antídoto da buzina. Dificilmente contará com a urgência de buzinar se todos ligarem o tradicional sinal luminoso. O sinal sonoro só é necessário em derradeiro caso, pela ausência do sinal luminoso.
Estamos consolidando uma nova cultura de desorientação. Os motoristas dirigem como se fossem pedestres. Como se estivessem caminhando. Alternam o lado impunemente, e contornam os obstáculos do mesmo modo que realizariam uma andança nas calçadas pelo bairro.
Passeiam com uma soberba distraída, com um egoísmo inconsequente.
A crença é que estão a pé, donos de seus passos, e não conduzindo máquinas perigosas e mortíferas capazes de atropelar e provocar acidentes.
Esquecem que são uma das peças dentro de um conjunto, que qualquer ato ignorado influencia as demais num tabuleiro complexo de ação-reação.
Dobram de repente, desprovidos de culpa se há alguém encostado em sua traseira. Quem se encontra atrás que redobre a vigilância e invente acrobacias.
Na sinaleira, atravessam inesperadamente da faixa oposta, criando o maior tumulto e gerando freadas de inopino de seus colegas de ocasião.
Saem da inércia de uma vaga não relatando a entrada no fluxo.
Não precisamos economizar sua luz, que o pisca seja usado para o mais inofensivo giro. A frequência não gasta energia, não consome bateria.
O pisca é pedir licença, o pisca é educação mínima, o pisca é oferecer tempo para o outro se preparar em troca de mais espaço.
E não adianta depois piscar o olho para ser perdoado pela malandragem.