Gostaria que o prefeito Sebastião Melo repensasse a sua iniciativa de suspender as eleições diretas para diretores nas escolas municipais.
É um pacto democrático que vigora há quarenta anos em Porto Alegre.
A prefeitura se valeu de seus advogados. Na quarta-feira (22), obteve uma liminar contestando a constitucionalidade da Lei nº 12.659/20.
Juridicamente, Melo está certo. Simbolicamente, está errado.
Segue a legislação. Existe um ordenamento jurídico que atinge todas as áreas. Servidores municipais, por exemplo, podem ter um pacto secular de cumprimento de 20 horas semanais, mas a lei determina 40 horas semanais. A lei está acima do pacto.
A questão é que Melo poderia compatibilizar a lei com a gestão democrática do ensino, de acordo com a interpretação do princípio constitucional da gestão democrática do ensino, previsto no artigo 206, inciso VI, da Constituição Federal. Tendo a função de governo a ele atribuída, pode prescindir da indicação de agentes públicos da sua confiança em cargos sensíveis, como o de diretor de unidade de ensino, para a consecução de seus fins.
A prefeitura, então, teria como abdicar do direito da indicação dos diretores e vice-diretores das escolas.
Trata-se de uma das primeiras ações antipáticas do seu segundo mandato.
Isso, de forma nenhuma, vai alavancar os indicadores educacionais da capital, apenas abolirá o pluripartidarismo dentro das instituições de ensino.
Se a ideia é evitar o sectarismo de esquerda, acaba-se unicamente propiciando o sectarismo de direita.
As escolas voltarão a ser cabides de emprego dos cupinchas da administração. Quem concorda com a ideologia praticada por Melo ocupará os cargos de comando. A oposição não terá mais nenhuma chance de representatividade.
Toda eleição direta garante que seja entronizado quem melhor traduz os anseios da comunidade escolar, privilegiando liderança, competência e carisma. O contato próximo do diretor com o seu quadro de servidores e alunos facilita o feedback na solução de problemas, já que existe um voto de confiança implícito nas urnas.
Retomar a indicação biônica significa um retrocesso histórico. Não estaremos favorecendo a postura técnica, mas a ideológica, e somente da ideologia da situação.
Em vez de corrigir falhas graves da sua gestão anterior na educação, cuja secretária vem sendo investigada por prática de corrupção e malversação, o prefeito sugere agir novamente contra a transparência. Cabe lembrar que o superfaturamento do material escolar e o desperdício do dinheiro público só foram descobertos devido a denúncias de diretores eleitos.
Ou seja, a medida parece uma caça às bruxas aos delatores das irregularidades.
Há, inclusive, um possível componente passional no ato, visto que o vereador Pablo Melo (MDB), filho do prefeito Sebastião Melo, foi afastado de suas funções por 180 dias pela Operação Capa Dura. A investigação apontou o parlamentar como suspeito de envolvimento em fraudes em licitações da Secretaria Municipal de Educação de Porto Alegre.
Por uma manobra astuta, Melo não encaminhou um projeto para a Câmara Municipal, da qual conta com a maioria dos vereadores e receberia certamente o aval para a mudança das regras do jogo. Ele optou pelo caminho judicial, indireto, para não ser responsabilizado de frente pela sua decisão. Para não precisar dar o canetaço.
Enquanto as escolas estaduais mantêm suas eleições diretas, ainda que os candidatos tenham que cumprir pré-requisitos, as escolas municipais são reféns de novos gestores, os antigos e jurássicos CCs.
Paradoxalmente, aquele que foi eleito pelo povo não quer mais o povo nas escolas.