Você brigava com seu irmão quando pequeno tanto quanto hoje.
Talvez até mais: querendo o seu brinquedo, tirando a sua atenção, implicando com os seus amores platônicos, zombando de seu estudo, ligando a luz quando ele desejava descansar, puxando as suas cobertas no inverno, roubando os seus casacos, indo para cima quando ele se encontrava distraído.
O que mudou é que, na infância, você pedia desculpa com mais facilidade. Você era obrigado a fazer as pazes antes de anoitecer. Não permanecia um dia de mal.
Mas, excetuando relações tóxicas ou abusivas, de modo nenhum o irmão ficou mais chato, mais egoísta, mais individualista, mais irritante com o decorrer dos anos. Continua sendo o irmão de sempre.
Você é que não tem mais a paciência de antes. Virou adulto. E os adultos carecem de tolerância. E os adultos são mais orgulhosos e teimosos. E os adultos se desgastam com o emprego, as responsabilidades e as contas a pagar. E os adultos são mais vingativos. E os adultos se acham donos da razão. E os adultos se escondem no escudo dos filhos e na fachada do casamento.
Naquela época, a diferença era que os pais não deixavam o atrito prosperar. Colocavam um de frente ao outro para se abraçarem e retomarem a convivência.
Ou o carinho, ou o castigo. Tinham que escolher.
O abraço acabava se tornando o castigo: forçado, duro, custoso, sofrido, contrariado, mas funcionava. Depois de uma hora, voltavam a se falar como se a rixa nunca tivesse acontecido.
Quando compreendemos que nada mudou da irmandade, resgatamos o gosto e a leveza dos laços. Afinal, entre vocês a lealdade e a provocação vinham em altas doses diárias.
Irmão é paraíso e inferno alternados. Não se cegue apenas com um dos mundos.
Vocês se estranhavam com igual intensidade com que riam ou aprontavam, porém não havia chance de amuo e birra dividindo o beliche e o quarto. Precisavam se sentar na mesa, lado a lado, de novo. Precisavam se acomodar no sofá ou banco do carro, lado a lado, de novo. Precisavam resolver as tensões para seguir adiante como família.
Se as palavras separavam por um momento, as atitudes de apoio logo recuperavam o território perdido.
Reatavam porque moravam juntos. Reconciliavam-se porque brincavam juntos. Você não botava fora a companhia tão importante contra a solidão, pois sacrificar o seu parceiro de vida seria o equivalente a se isolar. Não dava para jogar futebol sozinho, cartas sozinho, vôlei sozinho, qualquer tabuleiro sozinho.
Se atualmente você amarga uma desavença, pode bloquear o mano ou a mana para sempre. Abandonar. Suspender o contato. Esquecer. Fingir que morreu. Por um ruído de comunicação que sempre existiu. Por um estremecimento que sempre ocorreu. Por desacordos que sempre estiveram presentes.
O que falta é se perdoarem com mais frequência. Na maior parte das vezes, as discussões infantis são as mesmas.