“Vem chegando o verão, o calor no coração”, como cantava Marina Lima, na letra do saudoso Antonio Cicero.
O que me preocupa é a epidemia das canetas mágicas para emagrecimento, para colocar rapidamente o corpo em forma e não sofrer com as poses na praia.
Não são canetas que escrevem, mas canetas que apagam principalmente a gordura abdominal.
Duas delas — Ozempic e o Mounjaro — são tendências. Se alguém afina de uma hora para outra, certamente esses medicamentos levam o crédito.
Minha apreensão não é em relação a eles, mas em relação à automedicação.
Ozempic e Mounjaro exigem prescrição médica. São drogas injetáveis com efeitos colaterais. Dependem da supervisão de um nutrólogo ou de um endocrinologista. Não dá para sair aplicando sem controle, sem indicação, sem conhecimento de causa, sem a contrapartida de uma dieta e prática de exercícios físicos.
Não representam milagres, e sim compostos influentes adotados originalmente contra diabetes, estimulando a liberação de insulina pelo pâncreas. Nem todos precisam. Nem todos podem.
As pessoas pensam exclusivamente no seu poder de inibidor de apetite, e esquecem a identidade intransferível de cada organismo.
Tomar remédio por conta própria é uma temeridade. Não estou me referindo a consequências reversíveis como dor abdominal, arrotos, constipação, diarreia, vômitos, náusea e fadiga, mas a danos mais graves como doença do refluxo gastroesofágico, perda de cabelo e reações de hipersensibilidade.
Não é possível aumentar as doses por bel-prazer, tentando acelerar o processo para fazer bonito em alguma festa ou durante uma viagem.
Os produtos requerem cuidados especiais, como o armazenamento em baixa temperatura na geladeira. Não é permitido seu transporte numa bolsa ou numa mala, longe do devido acondicionamento. Eles estragam com facilidade.
Não se trata de uma brincadeira. Há rituais inadiáveis, há a necessidade de procedimentos orientados passo a passo, como a aplicação higienizada e a alternância da área da barriga para a injeção.
Dentro de meus medos, também existe a ausência do apoio familiar no tratamento.
Os usuários querem recorrer às canetas sem falar para ninguém de casa. Como um ato secreto. Para parecer que emagreceram espontaneamente.
Se ocorre uma anormalidade acentuada, os mais próximos desconhecem o que está acontecendo, dificultando o socorro.
Afora o fato de que as canetas são caras e costumam durar apenas quatro semanas.
Ozempic começa em R$ 1.100, e seu primo Wegovy, que alcança doses mais altas, custa R$ 2.500.
Mounjaro já se aproxima da casa dos R$ 10.000, incluindo importação e impostos, pois ainda não está disponível em farmácias brasileiras.
Ou seja, além de esconder a informação, aquele que comprou o fármaco talvez omita os gastos excessivos aos parentes, com alto risco de endividamento.
Que seu uso seja a partir de uma decisão coletiva, bem ponderada, com a cauta natureza de um investimento sério, empregado para combater casos insolúveis de saúde e consolidar a mudança de hábitos na conversão do sedentarismo e da obesidade. Senão é bem provável virar um vício e aniquilar de vez a autoestima.