
Em pleno século 21, com todo o conhecimento histórico e político já acumulado, como explicar o número crescente de pessoas dispostas a abrir mão da democracia em troca de aventuras autoritárias? A resposta é mais simples do que parece: os regimes democráticos não estão entregando o que prometem. O conceito de democracia está cada vez mais restrito ao ato de votar. Parece que basta ter eleições regulares e livres para que a tarefa seja dada por cumprida. Só que isso não basta ao eleitor.
Ao participar do processo, o cidadão deposita a esperança de que sua vida vai melhorar, o que não está acontecendo. Inflação, insegurança, corrupção e precariedade dos serviços públicos, entre outros fatores, alimentam a frustração popular. As elites agravam o problema. Distantes da vida real, mostram-se mais preocupadas em garantir privilégios e se perpetuar no poder.
Nesse quesito, direita e esquerda seguem o mesmo manual: a prioridade é sempre a próxima votação. Nesse ambiente, as campanhas eleitorais são grandes espetáculos de ilusão, onde se promete tudo, mesmo sabendo que o orçamento apertado pouco permite. Os partidos políticos, principal elo de sustentação da democracia representativa, em nada colaboram. Ao contrário, viraram balcões de negócios, onde alianças são forjadas sem afinidades ideológicas, por meio da troca de cargos, verbas e favores. Algumas siglas nanicas sequer tem a ambição de crescer, se contentando em sugar os recursos do fundo partidário e com algum posto de segundo ou terceiro escalão em governos que apoiam.
Cansado, o eleitorado dá sinais cada vez maiores de desistência, como demonstram os crescentes índices de abstenção. No pleito municipal do ano passado, por exemplo, a ausência média no país chegou a 29,26%, praticamente um terço do total cadastrado. A descrença do povo abre uma perigosa porta para soluções autoritárias e populistas. Brecha que extremistas políticos, com o auxílio das redes sociais, já vêm aproveitando para defender a escolha de governantes mais impositivos. A ameaça é real e crescente. O momento exige uma atitude firme de quem acredita que, apesar de todos os defeitos, a democracia ainda é o melhor sistema de governo. Ignorar os sinais de alerta pode custar caro: quando a reação vier, talvez seja tarde demais.