
Os estragos registrados nas lavouras de milho no Rio Grande do Sul ao longo das últimas semanas podem acabar se refletindo nos preços das carnes nas gôndolas do varejo. Como o grão é um ingrediente indispensável na dieta dos animais, principalmente aves e suínos, sua menor disponibilidade tende a aumentar os custos. Desta maneira, dirigentes do setor de proteína animal já admitem a possibilidade de reajustes serem repassados ao consumidor.
A indústria gaúcha de carnes vem demandando nos últimos anos em torno de 6,5 milhões de toneladas do grão, volume que, mesmo em safras sem incidência de problemas, não é totalmente suprido pela oferta no Estado. Em média, as empresas gaúchas costumam buscar 1,5 milhão de toneladas em outros Estados, como Paraná e Mato Grosso, e até mesmo do Exterior, em países como Argentina e Paraguai. Neste ano, com os revezes nas lavouras, o volume deverá aumentar.
— Ainda é precoce dizer o quanto devemos buscar fora do Estado. Precisamos saber o tamanho da quebra, mas estamos em estado de alerta. Devemos iniciar alguns movimentos de importações e também para sensibilizar o governo federal a agir para evitar disparada de preço da saca, caso se confirme quebra expressiva — afirma José Eduardo dos Santos, diretor-executivo da Associação Gaúcha de Avicultura (Asgav).
Um dos pedidos que o setor avícola deve apresentar ao Ministério da Agricultura é a realização de leilões de estoques da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab).
Maior demanda
No Rio Grande do Sul, a avicultura é a atividade que mais demanda milho, cerca de 2,9 milhões de toneladas anuais. O produto responde por quase 70% da alimentação dos animais. A Agrosul Alimentos, de São Sebastião do Caí, demanda 120 mil toneladas por ano. Assim como outras empresas do setor, busca em torno de 30% do produto fora do Estado. Em 2020, esse volume poderá chegar a até 40% do total.
— Se a quebra for considerável, a solução é trazer mais milho de fora do RS, e isso aumenta o gasto com frete. Esse custo acaba sendo repassado no preço do produto — diz Nestor Freiberger, presidente da Agrosul e da Asgav.
Se a quebra for considerável, a solução é trazer mais milho de fora do RS, e isso aumenta o gasto com frete. Esse custo acaba sendo repassado no preço do produto.
NESTOR FREIBERGER
Presidente da Agrosul e da Asgav
Na suinocultura, que demanda 2,4 milhões de toneladas, a situação é parecida. O diretor-executivo do Sindicato da Indústria de Produtores de Suínos do Estado (Sips-RS), Rogério Kerber, lembra que o setor vive momento de alta na demanda, puxada principalmente pelos negócios com a China. Se confirmando o reforço na busca por milho fora do Estado, o dirigente reconhece que é inevitável o repasse do custo extra ao valor final do produto:
— Ter de adquirir milho de fora do RS não é uma novidade, mas é evidente que a situação que ocorre agora traz tensão e poderá exigir um esforço maior da cadeia produtiva para se planejar principalmente para o segundo semestre do ano.
A produção de carne bovina no Estado também pode ter os custos pressionados, mas em menor proporção frente à avicultura e à suinocultura. A situação acende sinal de alerta no setor, ainda que o uso do milho na alimentação do gado seja restrito a poucas fazendas no Rio Grande do Sul. A maior parte do rebanho gaúcho é criada a pasto.
— Para quem utiliza o milho, caso de sistemas de confinamento, é bastante preocupante, pois tende a forçar os custos de produção em um momento que a carne bovina vem penando na questão de preços (para o consumidor). Já tivemos alta bastante forte no preço do boi gordo recentemente e isso vem se refletindo no consumo — destaca Ronei Lauxen, presidente do Sindicato da Indústria de Carnes e Derivados do Rio Grande do Sul (Sicadergs).
Preço da saca em elevação
Os primeiros levantamentos da quebra da safra gaúcha de milho indicam perdas significativas em diferentes locais. Segundo a Emater-RS, até 14 de janeiro, as perdas nas lavouras alcançavam 32% na região de Ijuí, 9% em Pelotas, 30% em Porto Alegre, 35% em Caxias do Sul, 29% em Lajeado, 25% em Soledade, 45% em Santa Maria e 5% em Bagé.
Como a oferta do grão será menor nesta safra, o preço pago pela saca vem subindo e se torna outro fator de pressão de custos. A Emater aponta que na semana de 9 de janeiro deste ano a saca de 60 quilos custava, em média, R$ 39,12 no Estado. Há um ano, saía por R$ 33,92, em valor nominal. O analista da Scot Consultoria Rafael Ribeiro aponta que a maior possibilidade é de que os preços sigam subindo.
— Não enxergamos cenário de queda de preços. A tendência é de que o preço da saca se valorize de 10% a 20%, dependendo do cenário (de quebra) — projeta.
O especialista lembra que a alta ocorre em diferentes Estados. As causas são a forte demanda, com recorde de 45 milhões de toneladas exportadas em 2019, e os problemas climáticos.
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