Quem precisa se deslocar entre Viamão e Porto Alegre no início da manhã já sabe disso há muito tempo: é preciso sair de casa com antecedência para não se atrasar para os compromissos. O trajeto de uma cidade para a outra é feito pela RS-040 e pela Avenida Bento Gonçalves, que diariamente registram pontos de lentidão e congestionamentos.
GZH visitou o local em uma quinta-feira e circulou pelo trajeto de maior movimento. Foram 22 minutos, a partir das 7h40min, para vencer um trecho de 4,8 quilômetros — que demoraria pouco mais de cinco minutos para ser percorrido em um cenário com fluxo baixo.
As filas de veículos começam a se formar ainda na RS-040, entre as paradas 32 e 31, na saída de Viamão. Os carros e motocicletas param na sinaleira da chamada Lomba do Sabão, próximo ao cruzamento com a Avenida Liberdade, e seguem andando lentamente por um longo período.
Cerca de um quilômetro depois, os veículos ingressam na Avenida Bento Gonçalves, já dentro de Porto Alegre, mas a situação não muda. Há muitas sinaleiras e diversos trechos com arranca e para e, quando o trânsito anda, a velocidade máxima não passa de 30 km/h. Enquanto isso, é possível ver carros e motos trafegando pela faixa azul, que fica à direita e tem uso restrito a ônibus, lotações e táxis em horários de pico, entre 6h e 9h e das 16h às 20h, de segunda a sexta-feira.
A situação fica ainda pior quando os veículos se aproximam do cruzamento com a Estrada João de Oliveira Remião, usada por quem deixa o bairro Lomba do Pinheiro, na Capital. Depois desse ponto, no entanto, o trânsito melhora, e é possível trafegar a uma velocidade entre 40 km/h e 50 km/h.
Até a João de Oliveira Remião, os veículos circulam em pista dupla, já que a terceira é a faixa azul. Na maior parte desse trajeto, há um largo canteiro central. Pouco antes de chegar ao cruzamento, os carros passam a circular em três faixas, já que, após esse ponto, os ônibus circulam por um corredor, localizado à esquerda, no lugar onde seria o canteiro que divide as duas pistas.
Poucos minutos que fazem a diferença
Os leitores que reclamaram sobre o deslocamento entre Viamão e Porto Alegre afirmaram que o pior horário é entre 6h30min e 8h30min. A funcionária pública Maria Cristina Câmara e Silva, 57 anos, relata que uma diferença de 15 minutos no horário em que sai de casa impacta em quase uma hora no tempo total de deslocamento:
— Eu saio de casa às 6h30min (em Viamão) e chego ao meu trabalho, na Rua Quintino Bocaiúva (em Porto Alegre), por volta das 7h. Mas se eu sair às 6h45min, vou chegar depois das 8h. É uma coisa surreal. Eu fico esperando no carro para trabalhar às 8h, porque não tenho o costume de bater o ponto atrasada. É uma hora de sono a menos, fora o estresse e o gasto com gasolina. Não tem quem aguente.
Maria Cristina mora em Viamão há 24 anos e lamenta o fato de a faixa azul, de ônibus, ter sido criada. Para ela, a medida impactou muito no trânsito, além de não haver fiscalização:
— Quando fizeram isso, não lembraram da quantidade de carros que vêm de Viamão. Tem dias que chega a ter tranqueira na faixa de ônibus. Canso de ver pessoas passando por ali.
Também moradora de Viamão, a arquiteta Adriana Dalmas Zabala, 54, enfrenta o problema desde 2017, quando se mudou para a cidade.
— Nos fins de semana, o trajeto até meu trabalho, no bairro Auxiliadora, dura 35 minutos. Mas, com trânsito, dura 60 minutos. É só no arranca e para, arranca e para, e só começa a andar mesmo quando chega na Ipiranga. Eu não marco reuniões na primeira hora porque algo pode dar errado. Se um carro estraga, se acontece um acidente, tranca ainda mais.
Além dos relatos citados na reportagem, GZH recebeu outros depoimentos por meio de questionário:
- Alexandre Appel, de Viamão: "É todos os dias (que os congestionamentos ocorrem). Moro em Viamão há 14 anos e é desde sempre. Perco mais de uma hora em um engarrafamento imenso".
- Patricia Maria Poli Kopper Móra, de Viamão: "Tenho que planejar 1h30min de deslocamento todos os dias, tendo um tempo pequeno de sono. (O problema ocorre) Há 15 anos".
Prefeitura busca mudanças em sinaleiras
Na avaliação do Executivo da Capital, o problema envolvendo a Avenida Bento Gonçalves não é o número de faixas disponíveis para os veículos, mas sim dois pontos de cruzamentos: a rótula com a João de Oliveira Remião e o acesso para as avenidas Ipiranga e Antônio de Carvalho. Nesses locais, há semáforos de três tempos, o que gera ondas de atraso que repercutem ao longo de toda a Bento.
Segundo a diretora de Mobilidade Urbana da Secretaria Municipal de Mobilidade Urbana da Capital, Carla Meinecke, a prefeitura está trabalhando em planos funcionais para tentar tirar o terceiro tempo dos semáforos, o que deve impactar positivamente no trânsito na região.
— A forma de conseguir retirar esse terceiro tempo está sendo desenhada. Tem alteração de geometria da via, por exemplo. Envolve obras na região. Já elaboramos algumas alternativas, estamos testando a capacidade da via e, se for aprovado, encaminhamos para a contratação dos projetos — explica.
Outra alternativa avaliada pela prefeitura é a construção de um viaduto no cruzamento da Bento com a João de Oliveira Remião — o que é facilitado pelas características das avenidas, já que a última está em uma posição mais elevada.
O engenheiro e doutor em Transportes João Fortini Albano acrescenta que a melhoria de outras vias que ligam Viamão a Porto Alegre poderia ajuda a dividir o fluxo de veículos.
— O que poderia ajudar muito seria a duplicação ou alargamento da Estrada Caminho do Meio, que sai de Viamão e termina na Avenida Protásio Alves. Há muitas obras residenciais ao longo dessa via, e ela está completamente estrangulada. Essas intervenções pontuais, junto com a RS-040 e com a Avenida Bento Gonçalves, dariam um encaminhamento de solução para o deslocamento de Viamão para cá — avalia Albano, que também é coordenador da Comissão de Transportes da Sociedade de Engenharia do Rio Grande do Sul.
Daer diz que não há intervenções programadas para a RS-040
Responsável pela RS-040, o Departamento Autônomo de Estradas de Rodagem (Daer) informou por meio de nota que, neste momento, não há nenhuma intervenção programada para o trecho, já que estão sendo priorizados os serviços elencados no Plano de Obras 2021-2022 do governo do Estado. A autarquia afirma que, ao longo dos anos, o trecho inicial da RS-040 perdeu as características de rodovia e passou a ser urbanizado, o que impactou no trânsito.
"Hoje, todos os acessos de Viamão estão direcionados para a ERS-040. Por essa razão, para melhorar o fluxo de veículos, seria necessário que o município disponibilizasse novas alternativas aos moradores", diz trecho da nota.
O Daer ainda afirma que a implantação da faixa azul fez com que os usuários de linhas de ônibus metropolitanas e municipais fossem beneficiados com redução de, aproximadamente, 25% no tempo de viagens. Já em Porto Alegre, a Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC) informou que a faixa exclusiva é "uma medida de priorização do transporte público que contribui para a regularidade das operações, mais agilidade nas viagens e economia de combustível, o que torna o transporte público mais atrativo e pode estimular sua preferência em relação ao automóvel, e assim reduzir congestionamentos".
O trecho da RS-040 administrado pela Empresa Gaúcha de Rodovias (EGR), entre Balneário Pinhal e o entroncamento com a RS-118, não foi considerado nesta reportagem.