
O Rio Grande do Sul enfrenta a quarta onda de calor de 2025, prevista para durar até o domingo (9). As altas temperaturas podem ter uma série de efeitos no corpo, causando taquicardia, mal-estar e até confusão mental. Especialistas ressaltam que, além desses impactos, o estresse térmico apresenta riscos importantes para a saúde reprodutiva de homens e mulheres.
Revisões sistemáticas, publicadas entre 2022 e 2024 na PubMed, portal dedicado à literatura biomédica, analisaram estudos feitos com humanos e animais. As publicações encontraram evidências de que o estresse térmico por calor — condição em que o corpo tem dificuldade para regular a temperatura interna devido a fatores ambientais — afeta a qualidade e a quantidade dos espermatozoides. Além disso, interfere nas funções hormonais e ovulatórias.
Efeitos no sistema reprodutor masculino
Embora ambos os sexos sejam afetados, a diretora associada de Assuntos Médicos da Organon, Nanci Utida, reforça que os homens podem ser mais suscetíveis à infertilidade causada pela condição. Segundo ela, o processo de formação dos espermatozoides, que ocorre nos testículos, chamado de espermatogênese, é sensível ao calor:
— A produção dos espermatozoides é diretamente influenciada pela temperatura da bolsa escrotal. Os estudos mostram que, em homens, o aumento da temperatura ambiente piora tanto a quantidade, quanto a qualidade desses espermatozoides. A cada ejaculação, o homem libera milhões de espermatozoides e esses dois fatores são importantes para a fecundação — explica Utida.
O estudo, publicado em 2022 por pesquisadores do Havaí e do Vietnã, pontua que a alta temperatura do ambiente também pode afetar a concentração, a motilidade (capacidade de locomoção) e a morfologia (forma e estrutura) dos espermatozoides, outros aspectos considerados fundamentais para definir a qualidade do sêmen.
— Além disso, o calor exagerado aumenta o estresse e altera o padrão de sono, o que também pode piorar a qualidade seminal — acrescenta a coordenadora do Centro de Fertilidade do Hospital Moinhos de Vento, Isabel de Almeida.
A especialista defende que, além do calor que faz na rua, outros episódios que envolvem o aumento da temperatura da bolsa escrotal, como obesidade e trabalhar com o laptop no colo por longos períodos, também pode impactar na fertilidade dos homens.
Efeitos no sistema reprodutor feminino

Evidências de modelos mamíferos encontradas por pesquisadores de Illinois, nos Estados Unidos, e publicados em 2024, indicam que o estresse térmico prejudica a função ovariana, alterando os perfis hormonais, reduzindo o tamanho e o peso dos ovários, comprometendo a qualidade dos oócitos — células que dão origem ao óvulo.
— Para as mulheres, é um pouco mais complexo, porque elas ovulam uma vez por mês, ao contrário dos homens que produzem espermatozoides a nível quase diário. Essa revisão mostra que esse aumento da temperatura tem impacto no que chamamos de foliculogênese — afirma Nanci.
Esse processo ocorre mensalmente, ao longo o ciclo menstrual, quando os folículos ovarianos — estruturas que abrigam os óvulos — se desenvolvem e amadurecem nos ovários femininos. Segundo a especialista, esses folículos passam por diferentes estágios de maturação até sofrer a ovulação e liberar o ovócito secundário, que só se torna um óvulo viável se for fertilizado por um espermatozoide.
Poluição também afeta
Isabel, do Hospital Moinhos de Vento, defende que as ondas de calor também geram impacto na poluição do ar e isso tem efeito comprovado sobre a saúde reprodutiva das mulheres:
— A poluição ambiental diminui a reserva ovariana para as mulheres. É uma associação que já se caracteriza em estudos animais e experimentais. Com isso, a fertilidade se reduz. Mesmo quando optam pela reprodução assistida, todos esses fatores acabam interferindo negativamente no sucesso dos procedimentos.
A especialista reforça que esses estressores ambientais também estão associados com a puberdade precoce nas meninas, desenvolvimento de endometriose, síndrome dos ovários policísticos e uma série de desordens ovulatórias que também impactam na fertilidade.
Com o que tomar cuidado?
O calor afeta a população de forma ampla, causando um impacto geral na fertilidade. No entanto, para Nanci, é improvável que esse impacto seja perceptível em nível individual. Ou seja, é pouco plausível que um casal busque um especialista para investigar a infertilidade e descubra que a causa do problema seja exclusivamente o calor.
Ainda, Isabel acredita que, para driblar esses efeitos, é interessante que os casais que desejam ter filhos cuidem outros aspectos que impactam a fertilidade. Ela aconselha a ter uma alimentação balanceada, fazer atividades físicas, cuidar o excesso de peso, não fumar, evitar bebidas alcoólicas e prevenir infecções sexualmente transmissíveis (ISTs), por exemplo.