O não cumprimento de, pelo menos, duas decisões judiciais de reintegração de posse em terrenos ocupados irregularmente, em Porto Alegre, resultou em duras críticas do juiz Alex Gonzalez Custódio à Brigada Militar. No despacho emitido na quinta-feira (31) para a retirada de 300 famílias instaladas em um terreno particular do bairro Humaitá, o magistrado alega que é público e notório que a Brigada Militar tem ignorado as determinações da Justiça para que dê suporte nas remoções, o que mancha a imagem do Judiciário e faz rondar o “fantasma da impunidade". O juiz Alex Custódio ainda ameaça, caso as ordens não sejam cumpridas, abrir processo por insubordinação contra o comandante-geral da Brigada Militar, o coronel Fábio Duarte Fernandes, e por desobediência contra o secretário Estadual da Segurança Pública, Airton Michels:
“À Brigada Militar não cabe tergiversar sobre a ordem judicial e, sim, cumpri-la. Nesse caso, tem que cumprir a lei. E a lei determina, frente aos requisitos, que a ordem de reintegração de posse seja restabelecida. Então, no caso de descumprimento, o que a gente faz: a gente oficia para que seja cumprida num caso razoável e vai ser cumprida a ordem. Não cumprida a ordem, daí tem as consequências que fogem a minha própria competência”, ressalta.
Por meio das assessorias de imprensa, a SSP-RS disse que iria aguardar o despacho do magistrado e o Comando-Geral da Brigada Militar defende que tem acompanhado o cumprimento das ordens judiciais de reintegração de posse. No entanto, tanto a reintegração de posse do terreno do bairro Humaitá, quanto a determinação de retirada das famílias que ocupam irregularmente o terreno da construtora Melnick Even, no bairro Cavalhada, não foram cumpridos pela Brigada Militar.
O prazo dado pela Justiça, em ambos os casos, encerrou-se nesta sexta-feira (1). O diretor de Incorporações construtora, Marcos Colvero, diz que a empresa tem uma equipe de plantão e mais três caminhões para auxiliar na remoção das famílias, mas aguarda o cumprimento da reintegração de posse pela Brigada Militar:
“Nós estamos com a estrutura aguardando ansiosamente o cumprimento da ordem judicial. No momento em que a Brigada sinalizar que vai dar início à operação, a gente tem condições de se mobilizar de forma bastante rápida”, ressalta.
Prefeitura diz que ocupações irregulares cresceram em Porto Alegre
Porto Alegre tem, pelo menos, 46 áreas públicas ocupadas irregularmente por famílias supostamente sem-teto. Destas, 26 pertencem à Prefeitura, que já reivindica a reintegração de posse na Justiça, e as outras 20 são Governo do Estado (conforme lista abaixo).
Na área de 10 hectares que pertence à Melnick Even, situado na esquina das Av. Cavalhada e Av. João Salomoni, no bairro Cavalhada, há aproximadamente 500 famílias instaladas.
Destas, 200 moravam à beira do Arroio Cavalhada e as outras 300 famílias são oriundas de diferentes partes de Porto Alegre e Região Metropolitana e não tinham onde se instalar. Um dos integrantes da ocupação diz que viu a casa em que morava rachar por causa dos freqüentes alagamentos na região. Lenemar Bastos alega que se inscreveu no programa da Prefeitura para obtenção de uma moradia popular em 2009, mas nunca foi selecionado pelo Departamento Municipal de Habitação (Demhab):
“Eu não trabalho no governo, não trabalho no anti-governo, não trabalho em nada. Eu só quero a minha casa, como foi prometido em 2009. Só isso. A minha casa tá pra desabar pra baixo do arroio. A Prefeitura não dá (a casa) e a gente ocupou a área da Avipal que é alta e seca. Então o que vai acontecer: se forem nos tirar a gente vai ter que ocupar outra área porque essas quinhentas famílias não podem ficar suspensas no ar. Elas estão aqui, elas fazem parte da cidade”, defende.
O juiz e as declarações polêmicas
No ano passado, o juiz Alex Custódio recebeu destaque na imprensa por usar um argumento da atriz Paolla Oliveira para fundamentar a condenação por tráfico de drogas a um jovem. Na sentença, o magistrado mencionou a afirmação da artista "Direitos Humanos é para quem sabe o que isso significa. Não para quem comete atrocidades de forma inconsequente." O juiz, também no ano passado, ao emitir uma condenação a parentes de Ronaldinho Gaúcho, alegou que a família do jogador se comportava como se tivessem um "verdadeiro BARONATO em Porto Alegre".
Gaúcha
Juiz critica descumprimento das decisões de reintegração de posse pela BM
Duas ordens com prazo para ser cumpridas nesta sexta não foram acatadas pela BM
Cristiano Goulart
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