Poucas vezes na história alguém chegou ao comando da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul com uma trajetória tão extensa na vida pública quanto a de Pepe Vargas. De vereador a ministro, passando pela Câmara dos Deputados e pela prefeitura da segunda maior cidade do Rio Grande do Sul, o político de 66 anos toma posse nesta segunda-feira (3) na presidência do parlamento gaúcho para o ano de 2025.
Escolhido pelos colegas do PT no rodízio vigente na Assembleia, que reserva a presidência às quatro maiores bancadas, Vargas almeja fazer do crescimento sustentável a bandeira de sua gestão.
— Ficou claro para todo mundo (em 2024) que as mudanças do clima estão aí e geram um prejuízo incomensurável. Precisamos enfrentar essas questões da adaptação e da mitigação dos efeitos dessas mudanças — resumiu, em entrevista à Rádio Gaúcha.
Casado há 36 anos com a ex-vereadora Ana Corso e pai de Isadora, 35 anos, e Gabriela, 30, Gilberto José Spier Vargas nasceu em Nova Petrópolis, mas ainda na infância mudou-se com a família para Caxias do Sul.
Caçula dos quatro filhos de um técnico em contabilidade e de uma professora, foi criado em uma família de classe média, com pais getulistas e críticos ao golpe militar de 1964. Adquiriu cedo o hábito da leitura e o interesse pela política e, ainda moço, quando vigia o bipartidarismo, fez campanha para o MDB.
Ingressou na Universidade de Caxias do Sul no final dos anos 1970 para cursar medicina e logo se engajou no movimento estudantil e na campanha de fundação do PT. Foi nessa época que conheceu Ana, líder estudantil que cursava artes.
Depois de formado, Pepe se especializou em homeopatia e chegou a ser diretor clínico do Hospital de Jaquirana, mas logo a política tomou a maior parte de sua agenda.
Estreou em eleições em 1986, quando concorreu a deputado federal para ajudar o partido. No pleito, até tentou usar o nome Gilberto, mas percebeu ali que seria eternamente conhecido por Pepe, apelido que o acompanha desde criança.
— Na primeira campanha dele, ele saiu com o nome de Gilberto Vargas, mas ninguém sabia quem era, todo mundo conhecia o Pepe — lembra a esposa.
Embora tenha José no nome e tenha crescido em em uma região colonizada por italianos, o apelido não tem a ver com o diminutivo de "Giuseppe". A origem é uma palavra em alemão utilizada pela avó materna para se referir carinhosamente ao neto, que acabou se transformando em "Pepe" entre os amigos de infância.
Carreira ascendente
Eleito vereador em 1988, inaugurou a bancada do PT na Câmara de Caxias. Principal expoente do partido, se lançou à prefeitura em 1992, quando ainda não havia segundo turno na cidade, e ficou em segundo lugar, a 3 mil votos do vencedor, Mário Vanin (PFL).
Mesmo com a derrota, manteve força, se elegeu deputado estadual em 1994 e conseguiu organizar uma nova candidatura em 1996, alcançando uma vitória improvável sobre o primo Germano Rigotto (MDB), então deputado federal e líder do governo Fernando Henrique Cardoso.
— O Rigotto chegou a Caxias de helicóptero, vestido de prefeito, com as pesquisas apontando-o lá na frente. Mas o Pepe teve uma grande recuperação e conseguiu virar — recorda Gerson Ben, assessor de longa data e coordenador da bancada do PT na Assembleia.
Em 2000, Pepe quase foi vítima de um fenômeno semelhante: largou na frente nas pesquisas, mas viu, aos poucos, José Ivo Sartori (MDB) se aproximar. No segundo turno, o petista triunfou por margem mínima, de 824 votos.
Embora tenha feito um segundo governo superior ao primeiro — pesquisas indicavam que a gestão era aprovada por 90% da população caxiense — o PT não consegui ampliar o leque de alianças e Marisa Formolo acabou derrotada por Sartori em 2004.
Pepe ainda voltaria a concorrer outras três vezes, mas o antipetismo crescente na Serra impediu seu retorno.
Marca em Brasília
Dois anos após deixar a prefeitura, Pepe se elegeu para o primeiro de três mandatos como deputado federal, período no qual foi relator da lei que criou a figura do microempreendedor individual (MEI). O auge em Brasília veio em 2012, quando foi chamado pela presidente Dilma Rousseff para assumir o ministério do Desenvolvimento Agrário.
Ele se preparava para disputar novamente a prefeitura de Caxias quando o convite chegou.
— Como vou dizer não para o convite de uma presidente? — refletiu, aceitando o cargo.
O ponto alto de sua passagem pela esplanada foi o braço do PAC que repassou máquinas a quase todos os municípios do país. Foram mais de 18 mil retroescavadeiras, motoniveladoras, caminhões e equipamentos para melhorar as estradas vicinais em mais de 5 mil cidades.
Pepe saiu do governo para disputar a reeleição como deputado. Quando voltou, ficou quatro meses na Secretaria de Relações Institucionais. Sem diálogo com o então presidente da Câmara, Eduardo Cunha (MDB-RJ), acabou movido para a Secretaria de Direitos Humanos, que deixaria em outubro de 2015, quando a tempestade do impeachment se aproximava.
Cansado da rotina em Brasília e escolhido para ser presidente estadual do PT, decidiu voltar as atenções ao Estado e retornar à Assembleia. Eleito em 2018 e em 2022, foi escolhido por unanimidade pelos colegas de bancada para presidir o Legislativo gaúcho em 2025.
Livros e futebol
Adquirido na infância, o hábito da leitura acompanha Pepe Vargas por toda a vida. Nas últimas férias, o livro escolhido pelo deputado foi O Pêndulo de Focault, de Umberto Eco.
Torcedor fanático do Juventude (nem cabe perguntar se o deputado torce para algum dos times da Capital), Pepe procura assistir aos jogos sempre que pode. Quando não consegue, telefona aos amigos para perguntar detalhes do jogo.
— Ele tem dois times: o Juventude o aquele que joga contra o Caxias —diverte-se o amigo Gerson Ben.
Além dos jogos do alviverde, nos momentos de folga gosta de assistir aos campeonatos europeus, como o inglês e o espanhol. Caseiro, não é afeito a grandes festas ou à boemia: prefere a companhia da esposa, das filhas e do casal de felinos Raja e Joaquim, adotados recentemente pela família.