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Ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro, o tenente-coronel Mauro Cid revelou à Polícia Federal (PF) que vendeu joias recebidas pelo então presidente a pedido dele, e lhe entregou em mãos US$ 86 mil. O dinheiro foi trazido dos Estados Unidos de forma fracionada, após a negociação com lojas naquele país. Entre os itens vendidos, estão relógios de luxo das marcas Rolex e Patek Philippe, comercializados por US$ 68 mil na Filadélfia, e um kit de joias Chopard, vendido por US$ 18 mil em Miami.
As revelações estão no acordo de delação premiada de Mauro Cid, cuja íntegra foi divulgada nesta quarta-feira (19) pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Bolsonaro e outras 11 pessoas foram indiciadas neste caso pela Polícia Federal (PF) por associação criminosa, lavagem de dinheiro e apropriação de bens públicos. A Procuradoria-Geral da República (PGR) ainda não apresentou denúncia.
O ex-ajudante de ordens afirma ainda que o então presidente levou para Miami no dia 30 de dezembro, quando deixou o Brasil às vésperas do término do mandato, uma mala contendo duas esculturas douradas, de um barco e uma palmeira, e um kit de ouro rosé (recebido pelo então ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, em visita à Arábia Saudita). Neste caso, Bolsonaro também solicitou que os itens fossem vendidos.
Cid seguiu a ordem, parte dos itens foi colocada em leilão, mas não houve arremate. Com isso, a última venda não foi efetivada.
Na delação, o tenente-coronel diz que no final de 2021 Bolsonaro deu início às conversas sobre a venda de presentes recebidos de autoridades estrangeiras. Por lei, estas joias devem compor o acervo presidencial. Primeiro, o ex-presidente apresentou o relógio Patek Philippe solicitando que ele realizasse uma pesquisa de preço.
“O COLABORADOR realizou a pesquisa e encaminhou a imagem ao presidente, conforme consta nos autos; QUE no começo de 2022, o presidente JAIR BOLSONARO estava reclamando dos pagamentos de condenação judicial em litigio com a Deputada Federal MARIA DO ROSARIO e gastos com mudanças e transporte do acervo que deveria arcar, além de multas de trânsito por não usar o capacete nas motociatas; QUE diante disso, o ex-Presidente solicitou ao COLABORADOR quais presentes de alto valor que havia recebido em razão do cargo”, diz um trecho da delação.
Na sequência, segundo o ex-ajudante de ordens, Bolsonaro solicitou que fosse feita a cotação e a venda de outros relógios e jóias. As transações no Exterior ocorreram inclusive durante agendas oficiais da presidência da República nos Estados Unidos, como a participação de Bolsonaro na Assembleia-Geral da ONU.
Além de ter armazenado os itens em sua casa nos Estados Unidos, o pai de Cid, o general Mauro Cesar Lourena Cid, ajudou a transportar parte do dinheiro para o Brasil. Segundo o tenente-coronel, os pagamentos foram feitos na conta do seu pai, e depois repassados sempre em espécie, "de forma a evitar que circulasse no sistema bancário normal".
"QUE o pagamento foi realizado em espécie sem emissão de nota: QUE não há registro da venda dos referidos bens: QUE em seguida retornou ao Brasil com os valores em espécie; QUE ao retomar ao Brasil entregou os U$ 18 mil ao ex-Presidente JAIR BOLSONARO; QUE apenas retirou os custos que teve com passagem aérea e aluguel do veículo; QUE o COLABORADOR ajustou com seu pai, General MAURO CESAR LOURENA CID, que o saque dos U$ 68 mil ocorreria de forma fracionada e entregue à medida que alguém conhecido viajasse dos Estados Unidos ao Brasil", relata outro trecho da delação.
Após o Tribunal de Contas da União (TCU) determinar a devolução dos itens vendidos ao acervo da presidência, foi realizada uma operação para que aliados do ex-presidente fossem aos Estados Unidos readquirir os produtos.