Em entrevista concedida na manhã desta quarta-feira (8) ao Timeline Gaúcha, da Rádio Gaúcha, o interventor federal na Segurança do Distrito Federal durante os atos antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023, Ricardo Cappelli, relembrou a tentativa de golpe de Estado ocorrida em Brasília, que completa dois anos.
Cappelli recordou a tensão ao se aproximar do setor militar urbano, observando manifestantes que retornavam ao acampamento instalado no quartel-general do Exército, em Brasília, após os atos de vandalismo, destacando a complexidade da situação e a possível conivência das Forças Armadas.
— Foi um momento muito tenso. Quando me aproximei do setor militar urbano, vi os manifestantes entrando por trás da linha do Exército, voltando para o quartel-general. É uma situação inusitada, pois eles invadiram e depredaram prédios públicos e estavam voltando para o acampamento como se nada tivesse acontecido — afirmou o então interventor federal, que também é ex-secretário-executivo do Ministério da Justiça.
O interventor detalhou os desdobramentos da invasão à Praça dos Três Poderes, que, por fim, levaram à detenção de 1,9 mil pessoas, das quais 1.552 se tornaram rés e 371 foram condenadas até agora. Ele relembrou ainda uma conversa que teve com o então comandante da Polícia Militar do Distrito Federal, coronel Fábio Augusto Vieira, sobre a preparação das tropas para reprimir a tentativa de golpe de Estado.
— Naquele momento, chamei o coronel Fábio Augusto e disse a ele que preparasse as tropas, pois iríamos entrar e prender todo mundo. No entanto, o coronel afirmou que, se eu entrasse com as tropas naquele momento, correríamos o risco de ter um banho de sangue. Foi um momento muito tenso. Então, indaguei: "Mas banho de sangue por quê? Está me dizendo que o Exército está protegendo os manifestantes?" Por muito pouco, não tivemos um cadáver no dia 8 de janeiro, pois eles (os manifestantes) tentaram assassinar uma soldada a golpes de barras de ferro — contou.
Entre os detidos pelos atos, 775 foram liberados devido a questões de saúde, idade ou responsabilidades familiares. A maioria, no entanto, permaneceu presa, enfrentando processos judiciais. Ao todo, 105 gaúchos foram presos, e apenas três não se tornaram réus.
— Vamos lembrar que realizamos a maior operação de polícia judiciária da história do Brasil, pois autuar mais de 1,5 mil pessoas em flagrante não tem precedentes no país — detalhou.
Julgamento
Cappelli expressou a crença de que 2025 será um "ponto de virada na história do Brasil", com o julgamento dos acusados de atentar contra a República, algo inédito no país. O interventor federal afirmou acreditar que o principal responsável pela revolta antidemocrática foi o ex-presidente Jair Bolsonaro, acusado de insuflar a massa golpista após as eleições presidenciais de 2022.
— Isso tudo só aconteceu porque houve a conivência e omissão do então chefe das Forças Armadas, que era o ex-presidente Jair Bolsonaro. Acredito que 2025 vai marcar uma virada na história do Brasil, pois, pela primeira vez, teremos no banco dos réus pessoas acusadas de atentar contra a República. Jamais na história do país houve um julgamento dessa natureza — ressaltou.
Em 21 de novembro de 2024, a Polícia Federal indiciou o ex-presidente Jair Bolsonaro e outras 39 pessoas, incluindo figuras de alto escalão do Exército, por crimes contra o Estado democrático de direito.