A disposição do governo do Rio Grande do Sul de investir R$ 490,2 milhões em obras de duplicação e melhorias em duas rodovias federais é rejeitada pela ampla maioria dos pré-candidatos a governador. Dentre os 11 concorrentes, apenas o ex-governador Eduardo Leite (PSDB), autor da proposta, defende o aporte.
Pedro Ruas (PSOL), Ricardo Jobim (Novo) e Vieira da Cunha (PDT) condicionam eventual apoio a uma compensação da União, que não consta no projeto de lei encaminhado à Assembleia Legislativa. Gabriel Souza (MDB) é outro que reivindica contrapartida, e diz que, sem essa previsão, irá avaliar o posicionamento junto à bancada de seu partido.
Os demais pré-candidatos argumentam que as obras na BR-116 e na BR-290 deveriam ser custeadas pelo governo federal e que os recursos do caixa estadual poderiam ser destinados a intervenções em estradas administradas pelo governo gaúcho ou em outras iniciativas.
Apresentado em março pelo Palácio Piratini, o projeto que autoriza o governo a custear as intervenções conduzidas pelo Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) deve ser votado na próxima terça-feira (12) pelos deputados.
Se for aprovado, o dinheiro do Estado será utilizado para acelerar a duplicação das duas rodovias e em melhorias estruturais nos trechos, como a construção de novo viaduto no complexo da Scharlau, em São Leopoldo, de seis passarelas sobre a BR-116, entre Canoas e Novo Hamburgo, e de acessos a Vila Nova do Sul, Santa Margarida do Sul e São Gabriel, na BR-290 (veja detalhes abaixo).
O governo afirma que, sem o investimento estadual, a duplicação das rodovias demoraria muitos anos e que, no momento, não há novos projetos de obras em rodovias estaduais prontos para a execução.
"Os prejuízos causados por não ter essas obras concluídas são imensos, tanto em termos mensuráveis de atraso nas entregas e afastamento de investidores, quanto em termos incalculáveis que são as perdas de vidas provocadas pelos acidentes de trânsito", diz trecho da justificativa da proposição.
A Famurs, entidade que representa as prefeituras do Estado, tirou posição favorável à iniciativa. A votação, no entanto, dividiu as associações regionais, demonstrando que muitos prefeitos são contrários ao investimento.
Veja, abaixo, a opinião dos pré-candidatos (listados em ordem alfabética)
O que pensa cada um dos pré-candidatos ao governo do Rio Grande do Sul sobre o aporte de R$ 490,2 milhões para investimentos em obras na BR-116 e na BR-290:
Sou contra. Basta percorrer o Rio Grande do Sul para identificar muitas rodovias estaduais precisando de duplicação, restauro e construção. É inadmissível dar uma de bonzinho, doando R$ 500 milhões para este governo federal, que acaba de tomar R$ 4 bilhões por ano de ICMS do Estado e dos municípios gaúchos.
Sou a favor de obras, e das obras das BRs 116 e 290. Porém, essas rodovias são federais. Então, por que o governo Bolsonaro não está pagando essas estradas? Cabe ao governador do Estado exigir que a União cumpra seu dever. Lula e Dilma investiram R$ 115 bilhões no Rio Grande do Sul, que resultaram em obras como a Rodovia do Parque.
São obras fundamentais para o Estado e com forte impacto no desenvolvimento econômico. Vão melhorar o escoamento da produção, facilitar acessos a regiões turísticas, poupar tempo dos trabalhadores e preservar vidas. Sabemos que as dificuldades orçamentárias da União atrasam a entrega, e temos pressa. Não existe povo federal, estadual ou municipal. Temos um único povo: o gaúcho, que será beneficiado.
Entendo que o Estado deveria solicitar a compensação dos valores investidos na sua dívida com a União. Não se trata apenas de aplicar recursos estaduais em uma rodovia federal, mas de investir em BRs que poderão ter melhor fluxo, mais apropriado, beneficiando todos os gaúchos.
A utilização de recursos em estradas federais é a maior demonstração da falta de planejamento por parte do governo do Estado, e pior, sem qualquer retorno aos cofres do RS ou no abatimento da dívida com a União, o básico de uma boa gestão. Os recursos deveriam ser aplicados em estradas estaduais sem pavimentação. Sou relator da lei que visa permitir que Estados e municípios aportem recursos em obras federais, abatendo a dívida.
O governo Bolsonaro fez mais pela BR-116 do que todos os anteriores. Com Bolsonaro a obra andou, e muito. O governo do Estado não tem projeto e joga para a torcida. Se tem dinheiro, por que não faz acesso asfáltico nos mais de 50 municípios que ainda não têm? Por que não paga a dívida com o IPE?
O dinheiro do governo do Estado deveria servir para matar a fome do nosso povo. Se, entretanto, realmente houver ressarcimento federal, face ao descalabro das rodovias, poderia ocorrer o investimento.
As obras de melhorias das BRs 116 e 290 precisam ser feitas, mas são de responsabilidade do governo federal. O Estado do Rio Grande do Sul, ao assumir esse encargo, está abrindo mão de verbas que poderiam ser usadas em outras áreas, como saúde, educação, geração de emprego e combate à fome.
O pacto federativo brasileiro é totalmente desfigurado e concentra poder e recursos em Brasília. Entendemos que os investimentos nas BRs são importantes, mas estes recursos deveriam ser abatidos na dívida que o Estado tem com a União. Se não forem, não é justo que sejam feitos com recursos estaduais.
A questão não é sobre a importância de se recuperar estradas que escoam a produção. Isso é ponto pacífico. A questão é a necessidade do governo do RS de olhar para estradas de chão batido ou em péssimas condições que pertencem ao Estado. Soa um pouco fora de propósito assumir algo que é de um ente bem mais capitalizado sem ganhar nenhuma grande contrapartida. Sou contra o modelo sugerido, não contra as obras em si.
Os investimentos nas BRs são absolutamente necessários e reivindicados pelas comunidades. Entendo que, como se trata de uma obra de responsabilidade do governo federal, deve ficar garantido o ressarcimento ao governo do Estado. Na forma como foi encaminhado, isso não está previsto. Portanto, somos contra.
Governo contabiliza votos para aprovação
O projeto que permite ao Piratini aportar recursos para as intervenções nas rodovias federais volta a trancar a pauta da Assembleia em razão da retomada da tramitação em regime de urgência, solicitada no mês passado pelo governo. A proposta esteve pronta para ser votada em maio, mas, na ocasião, o governo derrubou a urgência e o texto foi retirado da pauta.
Agora, o Piratini promoveu nova investida para tentar viabilizar a aprovação na terça-feira, último dia de votações antes do recesso parlamentar, que vai de 17 a 31 de julho. O líder do governo na Assembleia, deputado Mateus Wesp (PSDB), diz que já contabiliza os votos necessários para a aprovação do texto em plenário.
— Temos a compreensão de um número considerável de deputados, que entenderam a importância desse investimento para o desenvolvimento econômico do Estado — sustenta Wesp, ressaltando que, no momento, o Estado não tem projetos prontos para novos investimentos em estradas estaduais
Um dos mais críticos à proposta, o deputado Sérgio Turra (PP) mantém esperança de que os colegas rejeitem a iniciativa.
— O Estado, que agora está saindo do sufoco, não tem condições de passar dinheiro para a União concluir suas obras, Mesmo que tivesse, o Estado é devedor dos municípios. Temos muitos acessos asfálticos e ligações municipais por fazer — argumenta o parlamentar.
Para garantir a vitória, o governador Ranolfo Vieira Júnior deve receber os deputados da base aliada no fim da tarde de segunda ou na manhã de terça-feira, antes das sessões de votação. A agenda foi proposta por Wesp.
Para a aprovação do projeto, é preciso obter ao menos metade dos votos dos deputados presentes na sessão. Se todos comparecerem, o Piratini necessitará do apoio de pelo menos 28 parlamentares.
Os locais
Até R$ 490,2 milhões do caixa estadual podem ser destinados a quatro iniciativas em rodovias federais
Duplicação da BR-116 - Sul (Guaíba-Pelotas)
- Até 12 quilômetros de duplicação na região de Camaquã. Valor estimado de R$ 60 milhões
- Duplicação da ponte sobre o Rio Camaquã, em Cristal. Custo: R$ 36 milhões
- Valor total: R$ 96 milhões
Melhorias operacionais na BR-116 - Norte (Porto Alegre-Novo Hamburgo)
- Complexo Sinos-Scharlau, que engloba a construção de viaduto lateral ao existente na Scharlau e de conexão com a RS-240, em São Leopoldo, e complexo Esteio, que prevê duplicação do viaduto próximo ao parque de exposições e viaduto sobre a Avenida Celina Kroeff. Custo estimado: R$ 185 milhões
- Seis passarelas sobre a rodovia, entre Canoas e Novo Hamburgo. Custo: R$ 30 milhões
- Valor total: R$ 215 milhões
Duplicação da BR-290 (Eldorado do Sul-Pantano Grande)
- Duplicação de 12,6 quilômetros nas imediações de Butiá, incluindo passarela para pedestres e ponte sobre o Arroio Francisquinho, e de 14 quilômetros na região de Pantano Grande, incluindo ponte sobre o Arroio Tabatingaí, e conclusão do perímetro urbano de Pantano
- Valor total: R$ 165 milhões
Melhorias na BR-290
- Ações de segurança viária com implantação de rótulas de acesso para Vila Nova do Sul e Santa Margarida, e rua lateral no acesso a São Gabriel
- Valor total: R$ 14,2 milhões