O tumulto que ocorreu na última audiência pública da prefeitura de Caxias do Sul sobre o projeto de concessão patrocinada para a ocupação e gestão da Maesa ganhou nova repercussão nesta quinta-feira (27). Na sessão da Câmara de Vereadores, a vereadora Tatiane Frizzo (PSDB) — que também é Procuradora Especial da Mulher no Legislativo — usou o espaço de declaração de líder da bancada do partido para denunciar o vereador Lucas Caregnato (PT) por violência verbal contra a mulher. No plenário, ela apresentou o vídeo de GZH com a confusão (confira abaixo) para mostrar a discussão de Caregnato com a chefe de gabinete do Executivo, Grégora Fortuna dos Passos.
Diversos vereadores usaram o espaço do plenário para lamentar a atitude de Caregnato, inclusive as cinco parlamentares mulheres da Casa, entre elas, as petistas Rose Frigeri e Estela Balardin. Após apresentar o vídeo do momento da confusão, Tatiane afirmou que "nós, mulheres, somos muitas vezes desrespeitadas, constrangidas, diminuídas, e não podemos silenciar a esse tipo de situação". Ela pediu que "não basta ter discurso, tem que ter prática". Todas as vereadoras se solidarizaram com a secretária Grégora, e algumas citaram a vereadora Rose, que também alegou ter sido empurrada no momento do tumulto e, por isso, teve sua mão machucada (confira abaixo o que disseram as parlamentares na sessão).
Sobre a discussão, Grégora relata que se sentiu "desrespeitada pela forma com que o vereador agiu". Ela explica que estava tentando acalmar Caregnato para evitar uma situação ainda mais tumultuada.
— Achei que ele foi agressivo na forma como ele estava agindo. Ele estava desconsolado. Não acho que seja a forma mais adequada de agir, quando nos sentimos desrespeitados, desrespeitar. Temos que fazer com que as pessoas tenham bom senso nessas horas, e não que ataquem. O ataque não foi pessoal, não tenho nada contra o Lucas, mas temos que manter o nível de urbanidade em locais públicos. Ele estava descontrolado e nos desrespeitou — afirma.
Me senti desrespeitada. Achei que ele foi agressivo na forma como ele estava agindo. Ele estava desconsolado.
GRÉGORA DOS PASSOS
Chefe de gabinete da prefeitura
A chefe de gabinete lamentou a forma como as mulheres normalmente são tratadas "de uma forma diferente", o que, na avaliação dela, faz com que elas sofram mais na sociedade.
—A violência contra a mulher não é só com agressões físicas, ocorre também verbalmente e com gestos. Temos que coibir de todas as formas. Além de ser a Grégora, mulher, sou secretária, então é preciso levar em conta o cargo que se ocupa e medir as consequências dos seus atos. Fica constrangedor para mim. Além da situação vivida, que foi ruim, mas também nessa situação de ter a imagem vinculada, que também causa um constrangimento grande.
Ela explica que registrou um boletim de ocorrência contra o vereador Caregnato, enquanto pessoa física, e que os fatos estão sendo apurados pela prefeitura para que possam ser dados os encaminhamentos administrativos a respeito do caso. Segundo Grégora, a avaliação é necessária pois o caso envolve dano ao patrimônio público e porque ocorreu dentro da prefeitura.
Caregnato diz que foi empurrado e ofendido, mas pede desculpas
Em nota, o vereador Lucas Caregnato afirma que "o eventual excesso de linguagem não teve direcionamento, mas publicamente já me retratei sobre". Ele se refere a sua manifestação na Câmara de Vereadores na quarta-feira (26). Na fala, o petista relata a sua versão a respeito do tumulto, quando diz ter sido empurrado e ter ouvido ofensas contra sua mãe, o que irritou o parlamentar e o fez tomar uma atitude a respeito da situação. No discurso, ele também pede desculpas aos secretários da prefeitura envolvidos na confusão.
No calor da emoção, as vezes a gente se enraivece. Se se sentiram ofendidos, peço desculpas.
LUCAS CAREGNATO
Vereador de Caxias do Sul
— Já acompanhei nesta Casa várias coisas, e já vi várias pessoas indignadas com atos quando têm a sua integridade ameaçada ou aviltada. A minha atitude depois, até pela relação que tenho principalmente com o secretário (de Gestão e Finanças) Cristiano (Becker da Silva), era de tirar esse cidadão (o CC da prefeitura) dali. Cobrei dele e da secretária Grégora, com os quais tenho boa relação de convivência. No calor da emoção, às vezes a gente se enraivece, e não tenho nada contra a Grégora. Se de fato se sentiram ofendidos ou qualquer coisa do gênero, peço desculpas. Não tratei com palavras de baixo calão — disse Caregnato, na sessão do dia 26 de abril.
"A confusão teve início quando um CC da prefeitura fechou as portas do local onde estava acontecendo a audiência pública, proibindo as pessoas de adentrar e participar do evento. Na sequência, fomos empurrados e ofendidos pelo mesmo sujeito (CC da prefeitura) que proibia a participação popular, quando tentamos intermediar a situação, possibilitando a participação das pessoas. O eventual excesso de linguagem não teve direcionamento, mas publicamente já me retratei sobre", diz a nota encaminhada pelo vereador Caregnato.
O que disseram as vereadoras na sessão
Tatiane Frizzo (PSDB): "Aqui (no vídeo) já dá para ter uma real noção do que aconteceu e do quanto nos entristece ver esse tipo de postura. Quando alguém aponta o dedo em riste na sua cara, quando alguém grita com você, quando alguém dá um passo a mais a ponto da mulher ter que dar um passo atrás, até para se resguardar fisicamente, isso é uma agressão. Diariamente falamos nessa tribuna das agressões que as mulheres sofrem. Nós, mulheres, somos muitas vezes desrespeitadas, constrangidas, diminuídas, e não podemos silenciar (diante) esse tipo de situação. Meu total repúdio a esse tipo de situação, não podemos desrespeitar as mulheres no exercício da função que elas ocupam. Não basta ter discurso, a gente tem que ter prática."
Marisol Santos (PSDB): "Não estava lá, mas assisti ao vídeo. Me solidarizo também com a vereadora Rose, acho que ela tem que registrar a ocorrência, até porque tem vídeos que mostram como ela foi apertada ali na porta. Que as pessoas responsáveis por isso também respondam pelo que aconteceu. Precisamos pensar sobre isso, porque a gente fala que quando vem dos outros é truculento, e quando vem da gente é um "enraivecimento no calor da emoção". As mulheres, que de alguma maneira sofrem algum tipo de assédio ou violência, sabem e já ouviram isso em várias situações."
Estela Balardin (PT): "Em primeiro lugar, gostaria de me solidarizar com a secretária Grégora. Se ela se sentiu de fato violentada, cabe a nós, mulheres, nos solidarizarmos para ela saber que não está sozinha. Essa não foi a intenção do vereador Lucas, conheço e convivo com ele. Todos nós somos machistas em algum ponto por estarmos em uma sociedade machista. Sem sombra de dúvidas, não foi a intenção dele. Foi um momento de tensão. Me solidarizo com a vereadora Rose, que naquele momento foi empurrada e agredida de certa forma. Isso aconteceu porque as pessoas se sentiram preteridas nas audiências públicas, não se sentiram ouvidas. Várias coisas precisam ser revistas com isso que aconteceu."
Gladis Frizzo (MDB): "Fiquei muito triste vendo o vídeo. Conhecemos muito bem a secretária Grégora, e o quanto ela é atenciosa e sempre prestativa para o diálogo. Eu não posso acreditar que a porta estava trancada e que só iria entrar quem eles quisessem. A secretaria não merecia ter sido tratada daquela forma, me coloco no lugar dela. Ela é uma pessoa maravilhosa."
Rose Frigeri (PT): "O respeito às mulheres, principalmente num espaço tão pouco privilegiado para nós, realmente é um valor muito importante e muito caro. Conversei com a Grégora depois da audiência, ela estava abalada. A forma como meu colega se dirigiu a ela foi extremamente violenta de certa forma, embora o conteúdo da fala não foi de forma alguma ofensivo. Mas a maneira como ele falou foi (violenta). Já passei por muita violência de gênero em outros lugares, que não têm essa agressividade, às vezes são sutis. Temos que ficar alertas. Farei um boletim de ocorrência contra o cargo comissionado (CC) da prefeitura, que foi para cima, empurrou o vereador Lucas, me empurrou e machuquei minha mão por isso. Sou solidária (à Grégora). Há uma diferença entre forma e fala."
Entenda o caso
Após cerca de 40 minutos desde o início da audiência pública na terça-feira (25), alguns manifestantes protestavam do lado de fora do auditório do Centro Administrativo, onde ocorria a audiência, e que estava com a porta fechada e com assentos disponíveis. Além de se posicionarem contrários ao projeto da prefeitura que estava sendo apresentado, o grupo pedia para entrar no espaço e participar do evento. Neste momento, os vereadores Lucas Caregnato e Rose Frigeri, também do PT, foram até a entrada do auditório, e um servidor da prefeitura tentou impedir quando Lucas abriu a porta.
Caregnato e Rose acusam o CC de tê-los empurrado, o que irritou o vereador petista, que começou a discutir de forma exaltada, inicialmente com o secretário Cristiano Becker, e na sequência com a chefe de gabinete. Caregnato afirmava aos secretários que havia sido agredido e ofendido pelo servidor da prefeitura, e demandava que ele fosse retirado do local.
Em nota, a prefeitura alega que o grupo de manifestantes não entrou pois era necessário fazer inscrições prévias, além de que os participantes eram orientados a preencher uma ficha de presença na entrada. Além disso, a porta estaria fechada para que o barulho dos protestos não atrapalhasse o andamento do evento. De acordo com a chefe de gabinete, a prefeitura não estava proibindo as pessoas de acessar o auditório, que tem limitação de pessoas e apenas uma saída.
— Não podemos botar as pessoas em risco. A maioria dos jovens não queria acessar o recinto. Estávamos aguardando as pessoas assinarem o livro de presença, entrarem e sentarem — afirma.
Sobre a atitude do parlamentar, a nota da prefeitura diz que Caregnato "forçou a porta para permitir acesso irrestrito, danificando-a e insultando verbalmente aqueles que tentavam manter a ordem", e que o incidente será relatado à Comissão de Ética da Câmara. Logo após o ocorrido, ainda na terça-feira, Caregnato divulgou um vídeo no seu Instagram com um trecho da confusão. Nas imagens (abaixo), é possível ver o momento em que o vereador abre a porta do auditório e alega ter sido empurrado, assim como a vereadora Rose Frigeri.