Meu querido Gilberto Gil, o que foi aquele show no dia de seu aniversário, 26 de junho, direto do pátio de sua casa? Vendo pela internet, logo identifiquei os sinais de sua calorosa verve canceriana: a feliz reunião com os filhos, o ambiente doméstico, a fogueira acesa e aquele repertório do ancestral cancioneiro festivo nordestino. Só não esperava que eu fosse chorar em tantas passagens do show – lágrimas boas, de intensa alegria, de quando a gente se percebe elo de uma corrente antiga e poderosa de bondade e afeto. Pensei que essa reação tão emotiva se devesse a nossa origem comum, baiana, nordestina. Mas logo notei que o Brasil inteiro, e partes do mundo também, estavam sentindo o mesmo que eu. Agora eu me comovo só de rememorar esse presente que sua alma generosa nos deu: a chave para acessar o melhor de nós, como humanos, como país.
Enquanto escrevo, Gil, observo que mais de um milhão de pessoas já viram o vídeo do show no YouTube. Os comentários são como os meus, derramados, agradecidos. “Transborda meu coração”, escreveu alguém. “Curou todo o povo brasileiro”, disse outro alguém. Acho que somente um canceriano como você, Gil, na experiência de seus 78 anos, poderia acalentar seu povo desse jeito tão sábio e terno, maternal mesmo, como convém nesses tempos sombrios e desalmados. Luminoso é adjetivo que já lhe foi apontado. Pois já estava no céu de seu nascimento a conjunção do Sol com Júpiter, o gigante entre os planetas, astro da positividade e da fé. A Lua passava por Sagitário, o signo de Júpiter, a reforçar seu caminho de farol iluminador. O show recente tinha mesmo que se chamar Fé na Festa do Gil. Não à toa, você foi buscar na vibração do sagitariano Luiz Gonzaga a mensagem revigorante de que tanto precisamos.
Seu Gilberto, neste ano duro, Júpiter passa por Capricórnio, onde Saturno e Plutão também ilustram um clima de pessimismo e desalento. Estamos exaustos e sem esperança, Gil, num mundo findando e à deriva. E pela lei do equilíbrio do cosmos, é quando o complementar signo de Câncer se faz mais necessário, em sua expressão de cuidado e afeto. Sabiamente, caro canceriano, você veio ao nosso encontro, quente e acolhedor, de lamparina em punho, a nos mostrar que em nossas origens está a força que deve nos unir. Que a saída está no Brasil profundo e dentro de nós: na garra inata, nos vínculos, na cultura, na memória. As canções do seu show em família nos mostraram isso. E para reafirmar ainda mais o amoroso zelo nutridor canceriano, a celebração de seu aniversário também ativou uma campanha de auxílio aos operários dos bastidores de shows, que andam sem trabalho e sem dinheiro.
Você bem sabe do seu destino de guia, seu Gilberto. Também no YouTube está uma conversa sua com o ator Lázaro Ramos em que este lhe pergunta se você não desanima diante desse caos atual, e você diz, a sorrir: “Eu não vim pra desaminar, eu vim pra animar”. Animar significa impregnar de alma – uma arte sua, Gil. Você nos ensina a manter a luz acesa, mesmo nas piores adversidades. Caetano, seu parceiro de vida e arte, já contou dos anos de exílio em Londres, quando ambos foram expulsos do Brasil pela ditadura militar. Enquanto ele se deprimia, você, confiante, insistia em aprender e em ver mais além. A fé nunca lhe falhou, Gil. Por isso você é tão honesto e convincente quando faz desse lema uma canção. Assim, mestre Gil do Brasil, Buda nagô, Xangô menino, sábio preto velho, aqui, agradecido, desejo-lhe saúde plena, beijo-lhe as mãos e peço sua bênção.
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