O excesso de sensibilidade com a linguagem parece estar permeando todas as relações. A cartilha do politicamente correto é martelada na nossa cabeça com tanta insistência que passamos a duvidar do que sempre nos pareceu natural. Sou francamente favorável a buscar expressões que minimizam o preconceito e devolvam a dignidade a quem sofre por ser diferente da maioria. Nem melhor, nem pior: é simplesmente uma questão numérica. Um aspecto positivo de vivermos nessa época é que diminuíram as sanções destinadas a quem resolve se comportar segundo suas inclinações. Hoje podemos evidenciar qualquer sentimento ou preferência sexual, mas não é raro vacilarmos na escolha das palavras. Alguém pode se ofender. A contenção exagerada, o medo de infringir os códigos vigentes está nos transformando numa sociedade asséptica, sonegando a possibilidade de tudo ser e tudo dizer. Nem todos são guiados pelo senso comum. Somos seres que também se fascinam pelo que a moral condena. Os prejulgamentos podem até ser engavetados, mas dificilmente os eliminamos. Mesmo sabendo que não têm sustentação alguma. São filhos de seu tempo e, felizmente, tendem a perder força na medida em que os costumes se modificam.
Tento fazer a minha parte: procuro ser autêntico sempre que a situação me permite. É estranho dizer isso, pois deveria ser um estado natural, que sequer merecesse menção. Mas há que se acatar alguns limites, desde que prevaleça o bom senso. Tenho o cuidado de respeitar crenças religiosas, mesmo diferindo das minhas. Em política, o campo é mais maleável: muitos jantam hoje ao lado do inimigo de ontem. Na sexualidade tudo parece mais fluido, embora ainda se agrida e mate quem não segue os mandamentos do convencional. Mas já existem tantos canais de manifestação e denúncia, que a violência tende a arrefecer. Você duvida? Estude a história da nossa raça e descobrirá o quanto evoluímos. Fomos bem piores. Meu otimismo cresce cada dia mais. Não gosto mesmo é de viver engessado, numa espécie de camisa de força emocional. Isso pode ser dito e aquilo de jeito nenhum. Penso que quanto mais nos valemos da clareza naquilo que nos acontece, mais chance teremos de resolver o que nos aflige. Considero a honestidade uma condição essencial para que os encontros sejam construídos sem tantos engodos. Em algum momento magoaremos alguém e alguém nos magoará. Paciência. Ninguém é tão frágil que não consegue superar pequenos traumas psíquicos. Quando estamos impregnados desse propósito de nos expressar com verdade, evitamos uma série de mal-entendidos.
Isso não significa sair por aí dizendo tudo o que se pensa. Somos animais sociais e precisamos da aprovação alheia. A delicadeza é sempre bem-vinda. O que não podemos é viver assombrados pelo medo de estar usando expressões que possam ferir tudo e a todos. Quando estamos imbuídos de boas intenções, elas alcançam o seu propósito. A linguagem não pode ser polida a ponto de perder sua função precípua: a da comunicação. Não amordace o que só frutifica na liberdade.