Falar sobre como cada um se comporta sexualmente é delicado, pois entramos num campo em que as pessoas não costumam ser exatamente sinceras. Gostamos de nos vangloriar de proezas que flertam mais com a fantasia do que com a realidade. E quando tudo isso se mistura com princípios religiosos, aí mesmo é que a verdade fica escondida num canto, bem acanhada. Embora exista uma quase paridade de atitudes entre homens e mulheres, ainda gravita sobre ambos um silêncio levemente constrangido e que se manifesta nas rodas de conversa. A biologia cede para que a civilização e o comportamento aceito socialmente ocupem o seu lugar. O desejo humano é extremamente complexo. Não pertencemos à categoria dos poucos animais que se aninham com o parceiro escolhido e ignoram todos os demais. O que nos alimenta é a fome pela novidade, entendida aqui como a exploração de corpos diversos, impulso que o casamento tenta conter. Na prática não é bem assim. Casais apaixonados arrulham como pombos sobre os telhados. Mas a taquicardia ao ver o ser amado arrefece ao longo do tempo. Infelizmente, pois tudo seria bem mais fácil se nossos hormônios não continuassem entrando em ebulição. Acho sublime passar a vida ao lado de alguém na mais absoluta fidelidade. Física e emocional.
Não tenho dúvida de que certos afortunados conseguem atravessar décadas envoltos numa atmosfera amorosa que ocupa todas as horas de seus dias. Alguns disfarçam usando o discurso da ambiguidade. E há os que assumem a força do apelo erótico, passando a viver segundo códigos pessoais. Se, neste caso, isso se dá a partir de um acordo tácito, sem nada ocultar do outro, não me parece justo apontar o dedo invocando princípios que funcionam muito bem na teoria. Mas só. Em resumo: cada um deve ser feliz do jeito que quer e consegue. Meu sonho de parceria perfeita é aquela em que a vigilância é substituída pela liberdade. E nela nos satisfazemos com coisas mais relevantes do que espionar as camas alheias. O fato é que não somos que nem os flamingos, um dos raros bichos a professar exclusividade eterna ao companheiro ou companheira que escolheu para si. Quando as pessoas se derem conta de que o que nos torna seres melhores não passa necessariamente pela contenção da libido e pela restrição dos parceiros, teremos dado um grande passo. Mas respeito quem pensa o contrário. Algumas coisas passam pelo condicionamento e pela domesticação.
O que está nos manuais é o ideal. No mundo das gentes, vemos violência e morte só porque ousa-se desobedecer a noção de exclusividade. Gostaria de saber como agiríamos se, criados numa ilha longínqua, não recaíssem sobre nós tantas interdições morais. É uma pena que a palavra traição ainda nos machuque tanto. Então, se você descobrir algum pequeno “deslize” envolvendo quem está ao seu lado, relaxe e culpe a biologia. Afinal, estamos apenas obedecendo ao que está escrito nos nossos gens. Melhor saciar-se do que se frustrar com o que, permanecendo na fantasia, ganha as dimensões de um gigante.