Nunca fui tentado a adotar como lema essa frase atribuída (falsamente) a Gabriel Garcia Márquez e, por alguns, a Jorge Luis Borges. Ela se afigura como o mais inútil dos arrependimentos. Uma aposta de que, se nos fosse dada uma segunda chance, não repetiríamos os erros cometidos. Pode existir algo mais enganoso? O que consideramos falha, equívoco, desvio, não é senão a reação possível que tivemos diante das circunstâncias que se apresentaram.
Somos filhos do meio em que estamos inseridos e todas as respostas são consequência do que experimentamos. Sem contar o que ao primeiro olhar parece a pior opção e depois acaba se revelando o instrumento para instaurar o equilíbrio. Gosto de pensar que tudo acontece exatamente como deveria ser. Há sutilezas que nos escapam, respostas que parecem não ter nascido na nossa mente, mas que acabam sendo um precioso material para a depuração da alma. Tudo deve ser visto criticamente, claro, pois é essa aptidão de reavaliar que nos permite não incorrer novamente em relações minadas, por exemplo. Mas a análise tardia e insistente do que nos causou dor acaba por gerar sentimentos de desconforto e inadequação. Raramente é um salvo-conduto para o que de ruim poderá vir.
A capacidade de alimentar a certeza de que tudo é como deveria ser (e de que está como deveria estar) me tranquiliza. Acordo todo dia com a grata sensação de me sentir satisfeito com o que vejo ao meu redor. Não excluo a frustração do tecido da existência, mas não a transformo no centro vital da paisagem humana. Considero a felicidade um direito inalienável e me empenho diariamente para dar-lhe o maior espaço possível. Sei que nem tudo é subserviente à razão.
Quem de nós não agiu inúmeras vezes por impulso? Não sonho que seja diferente, pois é exatamente essa fissura, essa falta de certeza, que define a nossa humanidade. Conheço pessoas que, ao perceber que deveriam ter tomado um caminho diverso, passam o resto dos seus dias em ato de contrição. Sofrem inutilmente, almejando voltar atrás. Mal sabem que são essas pequenas dúvidas que ampliam em nós a consciência. Continuo repleto de gratidão. São os amigos que hoje tenho que desejo ter ao meu lado até o fim. Por que morar em outro lugar se é nesta cidade que encontro o que me nutre? Trabalho promovendo arte e mil vezes quero permanecer cercado de beleza e criação. E outros exemplos poderia dar para jamais repetir a frase inicial. Talvez tudo possa ser resumido nisso: não se prive e evite olhar para trás.
Tenho dificuldade em conviver com quem se lamenta constantemente. Mal sabem que são os artífices de um inferno construído por eles próprios. E que ninguém os pode tirar de lá enquanto não assumirem ser os responsáveis. Ganhei e perdi, mas continuo sendo quem eu desejei ser. No claro-escuro da existência, tento dar o melhor de mim. Faço alquimias, pois reconheço o ouro que está a minha disposição. Meu mérito é saber garimpar.
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