Qual foi a última vez que você olhou para o céu? Ou tem andado tão ocupado que acha isso uma perda de tempo? Se a resposta for afirmativa, permita-me discordar, pois as horas mais bem gastas são aquelas que nos distraem das obrigações cotidianas e nos deixam devaneando, em busca de riquezas que não podem ser guardadas em cofre algum. Acomodar o corpo sobre a grama orvalhada, relaxar os músculos e a alma e simplesmente contemplar. Este manto coalhado de estrelas me comove sempre e é como se um silêncio apaziguador invadisse meu ser. Os pensamentos parecem abandonar a mente e quase se pode tocar o vazio, numa doce sensação de que voltamos a pertencer a tudo.
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O brilho incandescente de cada pequeno ponto luminoso nos acalma, como se nosso destino não fosse senão observar. Na semana que passou, o espetáculo parecia mais belo ainda, pois uma lua cheia e dourada exibia-se para nosso deleite. Parecia o brinquedo de um imenso carrossel a encantar crianças e adultos. A comover poetas que pisavam em poças d’água, absortos de si, bebendo o espetáculo que se renova todos os dias e que tantas vezes insistimos em não ver.
E então lembrei de uma crônica do Sérgio Faraco, grande escritor do Alegrete que dizia: "O professor Ênio Campos... Lembro-me vagamente de vê-lo caminhar, mãos para trás, cabisbaixo, olhos profundos e escuros que só se erguiam para sondar as noites estreladas. "Felizmente os agiotas não são donos das estrelas", escreveu o professor, pois se o fossem "eu teria de pagar juros a vida inteira". Ler algo assim sempre me deixa mais feliz. E tudo o que parecia tão importante simplesmente desaparece diante de mim. Que pouca importância tem a última negociata política ou a queda de juros determinada pelo Banco Central. Perseveramos em viver como imortais, esquecendo que nos equilibramos sobre os fios da fragilidade. Fascinados pelo poder, louvamos o que perece e contamina o verdadeiro significado de nossa passagem por aqui.
E nos regozijamos em dizer aos amigos que somos práticos e focados no que realmente conta. Gosto de deixar poucos rastros, compondo manhãs de nada fazer. Há tanta beleza em pisar leve e apenas sussurrar. Em não ser responsável pelo destino de ninguém, senão quando acolhemos como exercício de compaixão.
Amar o firmamento não é devaneio juvenil. Suspender a respiração pelo encantamento que provoca cabe aos seres maduros. Os que passaram pelos ciclos da vida e sabem o que merece ser carimbado com o selo da permanência. Nesta época outonal, não ocupe todos os minutos. Dê vazão à preguiça, promova pequenos feriados, mesmo que durem somente duas ou três horas. Não morra antes da morte física. É possível conhecer a transcendência agora mesmo. Considero isso uma bonita maneira de rezar. É possível que, sem saber, estejamos ajudando a salvar o mundo, pois essas pequenas alegrias fazem parte do calendário da eternidade.
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