Assisti a dois documentários instigantes na semana que passou. Ambos disponíveis na Netflix. O primeiro chama-se Ram Dass: A caminho de casa. Relata a vida desse pesquisador e professor espiritual que, ainda na juventude, iniciou suas buscas para a ampliação da consciência fazendo uso de alucinógenos. Depois morou longo tempo no Oriente e aprofundou sua experiência em contato com um mestre que reverencia com amor incondicional. O filme retrata os anos mais recentes desse ser que se ilumina pela coragem, depois de ter sido acometido por um severo derrame.
É emocionante absorver suas palavras plenas de sabedoria, sua doce aceitação do infortúnio e sua preparação para a morte. Nenhuma revolta perpassa seu olhar, e o que ouvimos são apenas expressões de gratidão, de acolhimento de tudo o que lhe aconteceu. Sorrindo constantemente, ainda parece disposto a nos mostrar que o percurso pode parecer árduo, mas que no final sempre vale a pena. Nesse constante exercício de desapago, vemos um homem fragilizado fisicamente. Mas que se agiganta quando fala da alma e da inevitável despedida com a qual todos nós nos confrontaremos um dia.
Na mesma noite, vi a narrativa do último ano de trabalho frente às câmaras do lendário ator pornô italiano Rocco Siffredi. Não o fiz com menos entusiasmo que o anterior, pois estava curioso em saber o que pensa uma pessoa que passou décadas praticando sexo compulsivamente. Deparei-me com um homem bastante inteligente, que planejou cada passo de sua carreira e que tem a lucidez de dizer que se divertiu muito, mas que, de certa maneira, viveu numa prisão, vítima de seus instintos. Chega a ser quase comovente o relato em que lembra sua absoluta incapacidade de se saciar. Para ele, pouco importava se sua parceira tivesse 18 ou 70 anos. Precisava sentir o alívio momentâneo proporcionado pelo orgasmo. Mais ou menos como qualquer drogado. Pura compulsão. Hoje, com mais de cinquenta anos, analisa em retrospecto a sua história e reconhece erros e acertos. Aproveitou muito, revela, sob o olhar atento e amoroso da esposa e do filho. Sim, ele tem uma família "normal". Duas realidades que nos parecem irreconciliáveis.
Ao final, pensei que tanto o pensador quanto o ator foram conduzindo suas existências no sentido de delas extrair o que lhes parecia melhor. Quem somos nós para julgar onde há retidão ou desperdício? Sentimo-nos induzidos a crer que o corpo merece certo desprezo diante da possibilidade de ascendermos rumo a uma transcendência. Pode não ser tão simples assim. Cada um precisa percorrer a sua jornada. Aqui vemos vidas sendo construídas a partir de propósitos que nem sempre alcançamos. Talvez o ser humano afortunado seja aquele que nada abandonou e de nada abdicou. Só lá mais adiante, quando as forças faltarem, é que deveremos decidir onde deveríamos ter colocado as moedas que nos ajudarão a fazer a travessia.