Não sou uma pessoa facilmente irritável. Procuro testar até o limite meu grau de tolerância, nem sempre com sucesso, diga-se de passagem. Mas é um exercício profilático, de cunho filosófico. Porém, ando tendo pouca paciência com os que se aproximam para reclamar que estamos na eminência do fim dos tempos. Bradam, com a voz imperiosa dos autoritários: que saudade dos dias em que... Ah, tenham dó! Não duvidem se, transportados magicamente à época tão desejada, sufocassem de vontade de dela sair correndo.
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E vir se instalar nesta que antes lhe causava tanto desconforto. Na impossibilidade de serem transladados desse horror contemporâneo, deleitam-se em mostrar aos ingênuos o tamanho da violência que nos assola, a leviandade das relações amorosas, a ausência total de ética - essa palavra tão profanada e tão mal-entendida. Sonham com um paraíso que nunca existiu. Porque a questão, parece-me evidente, está além da geografia ou da modernidade. O único entrave para a tão clamada felicidade, a morada permanente no Éden, chama-se ser humano. Cinco ou seis páginas de qualquer compêndio de história dirão mais do que qualquer esforço que eu possa empreender. Nunca foi diferente, muda apenas a graduação. E se alguma dúvida ainda restar, por gentileza, apontem-me onde e quando tivemos mais liberdade de escolha do que hoje. E me refiro a ideias, comportamento, sexualidade, profissão, etc. Se você não nasceu no Afeganistão ou outro país dominado por ideologias ou religiões extremistas (desconfio haver aqui certa redundância), poderá experimentar e experimentar-se quase que infinitamente.
Portanto, vamos ser mais generosos com a realidade que nos cerca. Aproveitar o que há de bom – e olhe que não é pouco. Os arrogantes e donos da verdade parecem ser maioria? Sorry, sempre foram. Só que, antes, não tinham os meios para expressar-se tanto. Graças à internet – maravilha e caos – tudo está posto sobre a mesa. Mas lembre-se: cabe a você filtrar o que lhe parece positivo ou execrável. Ninguém está colocando uma arma na sua nuca e o obrigando a, digamos, assistir ao vídeo da Anitta. O mundo não foi e nunca será formado majoritariamente por seres que apreciam música clássica ou filosofia. Cada um deve escolher a sua turma, com quem terá prazer em dialogar e, se possível, treinar seu senso de humor. Vamos continuar rindo do que nos parece destituído de profundidade. Afinal, deve ser muito chato ser sisudo vinte e quatro horas do dia. Dá para se divertir sem comprometer a nossa estatura intelectual, quando isso for um valor para nós. No mais das vezes, pense que não costumam mais queimar na fogueira nem homens e nem livros. A democracia é imperfeita? Bem, eu não gostaria de morar na Venezuela e muito menos na Coreia do Norte. Fixar-se no que há de agradável não é ser inocente útil, mas saber viver com mais leveza, sem tanta gravidade.
Dê menos espaço para a mágoa e o azedume. Hoje é bem melhor. Aproveite.
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