Há seres que, em sua fragilidade, veem o mundo desabar diante da menor adversidade. Não suportam uma dor de cabeça, andam pela vida como se estivessem numa trincheira em busca de invisíveis inimigos. Não parece ser uma opção, mas algo ligado à própria personalidade. Uma espécie de marca de nascença. Sofrem pelo que não deveriam, gastando-se inutilmente, antes do anúncio das possíveis tristezas que nos esperam. Não buscam consolo porque sentem-se imersos no inevitável. A religião pode atenuar um pouco as fatalidades reais ou imaginárias. Suspiram, enfraquecidos, diante de coisas tão pequenas, que mal lhes sobra forças para abraçar as perdas que a existência coloca em nosso colo. Lamentam o fim sem sequer estarem habilitados para os começos. Conhecem tão somente as vésperas, antecipando dilúvios, quando o que ocorria era apenas uma leve brisa. Não os expulsemos de nossos dias, pois seu quinhão é feito de chumbo, mesmo ao contemplar um jardim. Pois a realidade é sempre filtrada pelo nosso eu, e não há homem ou mulher que a veja de igual maneira. Convalescem sem nunca ter adoecido; sentem-se cansados bem antes de partir. Convidam-nos a partilhar com eles esse teatro das sombras, de poucas cores e raro sol. Onde há poesia, enxergam gravidade, noite, a alma em suplício diante do que se exaure. Morrem de manhã, sem conhecer a beleza dos crepúsculos.
Ah, se pudessem ser contaminados pelos que passeiam leves ao seu lado, transformando o arco dramático de toda a existência num rico material para moldar a si mesmos. Estes têm a têmpera dos heróis, mas não sonham com epopeias e muito menos com a glória. Escondem-se na delicada tessitura do cotidiano, e mesmo que sejam intimados a conviver com a morte de seres amados, renovam seu gosto pelas paisagens de dentro e de fora. Sentem-se tocados pela desordem e pela fugacidade, mas expulsam a desistência. Como Sísifo, carregam suas pedras montanha acima, mas não as deixam tombar. Sua força não se revela apenas diante das contingências. Parecem permanentemente aptos a atravessar muros, reconhecendo alturas e extensões sem se vitimizar. Costumam ser práticos, objetivos, limpando ao seu redor os detritos remanescentes dos vendavais. Carvalhos com a flexibilidade dos bambus. Invejo-os por fazerem com que a esperança caminhe lado a lado com a razão. Vivem bem na abundância e na falta, pois o que os alimenta não provém dos extremos. São constituídos de cerne e o tempo deposita neles coragem, persistência, serenidade.
Afinal, podemos escolher o que seremos? Qual é nossa parcela de responsabilidade nos fracassos ou nos êxitos? Que cada um de nós seja complacente e severo consigo, ao mesmo tempo. Só assim saberemos com mais clareza quem somos – libertando os outros de inúteis julgamentos.