O mais novo escândalo de desvio de dinheiro público não surpreendeu ninguém, mas nem por isso deixa de ser revoltante. Depois de tantos casos de corrupção, já era esperado. O que provavelmente tenha nos indignado muito mais dessa vez foram as vítimas dos desvios: aposentados, velhinhos e velhinhas incapazes de evitar o roubo de seu dinheiro depois de tantos anos de contribuição ao INSS.
O desconto de cerca de R$ 60 ia para sindicatos e entidades como uma tal de “Contag” ou ainda uma coisa chamada “Associação de Desenvolvimento Rural Família Feliz”. Dificilmente seria percebido pelos pensionistas na era da digitalização total e compulsória dos extratos das contas do INSS. Quantos aposentados conseguem lidar com o mundo digital sem se perder em senhas, logins, verificação de duas etapas, menus quase sempre confusos?
O esquema era de uma perversidade chocante: os investigadores da Polícia Federal (que ainda mantém certa independência e coragem) identificaram que algumas dessas associações tinham suas sedes a cerca de 900 quilômetros de distância da residência do cidadão descontado. Como disse um policial, é bem difícil imaginar que os aposentados, todos com mais de 60 anos, iriam para outro Estado só pra se juntar a sindicatos tão distantes — ainda mais sabendo como seria complicado conseguir ajuda dessas entidades quando precisassem. E se quisessem se desfiliar, teriam que ir presencialmente. Ou seja, o esquema foi feito para amarrar e extorquir idosos.
Ando estranhando o silêncio da oposição, pouquíssimos deputados e senadores se manifestaram. Por quê? O pessoal alinhado com o governo federal já começou aquela guerra de narrativas nas redes sociais com a falácia de sempre, dizendo que o esquema começou no governo anterior. Mas por que então continuou no governo atual? Pior: por que saltou de desvios na casa dos milhares de reais para desvios de milhões de reais de 2023 em diante? Quem responderá por isso?
São questionamentos válidos num regime democrático, em que os cidadãos pagam seus impostos e contribuições, mas jamais veem o retorno disso. O que fazem com o cidadão brasileiro é roubo. Que outro nome se dá a uma situação em que nos tiram dinheiro e nada nos é dado em troca? Mas a pergunta que mais me intriga é: onde foram parar R$ 6 bilhões? Quem mais se beneficiou do esquema? Como esse dinheiro será usado?
Tenho algumas hipóteses. A primeira, enriquecimento ilícito: incapazes de vencer na vida honestamente, vão poder comprar seus símbolos de status com o dinheiro desviado de aposentados. Vão usar a grana para viagens ao exterior, se hospedar em hotéis caros, comprar relógios Rolex, joias e roupas de grife, simular uma riqueza e ostentar uma importância social que jamais terão. Quem enriquece assim nunca será realmente bem aceito e respeitado à mesa de quem tem classe. A segunda hipótese é a que mais me preocupa: o dinheiro foi para um caixa 2 para alimentar um projeto de poder. E quem vai parar essa gente?