Todo mundo lembra como foi sua última semana normal antes do confinamento em 2020 por causa do covid-19. Foi exatamente cinco anos atrás: dei aula presencial para meus alunos de inglês, fui a um evento numa vinícola, depois passei um final de semana na praia com a família. Na volta, entre 16 e 17 de março, vieram os decretos para suspensão das atividades escolares. Depois disso, tudo pareceu acontecer muito rápido: o fechamento do comércio, o uso das máscaras, o toque de recolher à noite, a interrupção dos serviços, os primeiros casos de coronavírus e as notícias das primeiras mortes aqui no Brasil.
Um dos momentos mais tocantes daquela semana foi quando encontrei a dona de uma loja aqui na rua de casa fechando as portas sem saber quando abriria de novo. As vozes embargadas enquanto conversávamos, as lágrimas que escorriam sem nem tentarmos enxugar o rosto: nunca mais vou esquecer. Havia medo, mas havia muita tristeza diante da nossa impotência contra um evento histórico acontecendo no nosso presente.
Naquele março de 2020, a gente se agarrava a qualquer esperança de que fosse apenas um transtorno passageiro. Fui rever meus arquivos daquela semana e encontrei um post que publiquei em rede social: era um aviso aos meus alunos de que as aulas seriam online “até 6 de abril”. Ao ver este post senti uma compaixão tremenda por aquela versão de mim mesma que não fazia ideia do que viria: não foram dias, foram anos lidando com uma doença que matou milhares de pessoas no mundo, deixou traumas físicos e psicológicos em outras tantas, destruiu sonhos, faliu negócios e empobreceu famílias.
A verdade é que há quem até hoje sofra as consequências econômicas e emocionais da pandemia que, de muitas maneiras, ainda não terminou. Mas cá estamos seguindo em frente. Ao pesquisar algumas datas e fatos para escrever essa coluna, me deparei com uma foto que tirei da minha filha naquela primeira semana de confinamento, aos 12 anos, sentada de pés descalços desenhando na calçada do pátio com giz. Ela parecia ao mesmo tempo tranquila, resignada, mas com um quê de preocupada. Ao ver essa foto de cinco anos atrás, não consegui segurar as lágrimas. Alguma coisa aqui dentro de mim ainda não se curou depois de 2020, mas o choro foi também de gratidão. Passamos por mais essa.
O nosso mundo foi alterado profundamente por causa da “peste”, como diz meu pai. Na verdade, na história da humanidade, sempre foi assim: uma pandemia precede uma crise de valores e de incertezas que, por sua vez, precede conflitos, guerras e crises financeiras. Pior: às vezes, acontece tudo isso junto ao mesmo tempo. Como ficar de pé? Como ser resiliente?
Pelas lembranças que tenho de como encarei 2020, eu apenas segui o ensinamento do grande Winston Churchill: “Quando estiver atravessando o inferno, não pare”. Tivemos que desaprender algumas coisas e aprender outras, tivemos que criar e recriar, tivemos que inventar e nos reinventar. E assim não paramos.