Um dos maiores privilégios que alguém pode ter é participar de um evento onde se pode aprender com quem é mais inteligente e mais versado num determinado assunto. Em questão de poucas horas, conceitos são atualizados, visões são remodeladas e ampliadas, estratégias começam a ser traçadas depois de se qualificar seu ferramental para lidar com um mundo em ebulição como nos tempos em que vivemos hoje.
Em palestra promovida pelo Simecs, o engenheiro civil e mestre em gestão pela FGV, Roberto Motta tratou de temas como geopolítica, o mercado global em transformação e o impacto das tensões em escala mundial, principalmente tudo que envolve China, Rússia, Europa, Estados Unidos e América Latina. Mas, como sempre acontece quando se ouve um palestrante com uma bagagem imensa de leituras, análises e conhecimento, Motta também abordou um conceito que me fez ver de forma muito diferente problemas gravíssimos que enfrentamos na nossa sociedade.
Ao tratar de questões relacionadas ao narcotráfico e à tragédia que é o vício em drogas como a cocaína, Roberto Motta citou o conceito de cultura do psicólogo e pesquisador holandês Geert Hofstede (1928-2020). Ele define cultura como o “software mental” que influencia a forma como indivíduos percebem, pensam e agem.
A cultura é aprendida, compartilhada e internalizada dentro de um grupo, moldando valores, crenças e comportamentos. Como se fosse um software que faz um computador funcionar, esse “programa” cultural diferencia sociedades e orienta interações sociais, decisões e a adaptação a ambientes diversos.
Nos últimos anos, infelizmente, esse “software mental” foi hackeado com propósitos não muito claros, mas certamente perversos. Inúmeras famílias têm sido bombardeadas com produtos culturais – filmes, seriados, influencers, artistas – que fazem apologia a práticas e comportamentos que causam danos aos indivíduos em curto e médio prazo.
Um exemplo evidente é campanha franca para descriminalizar, ou pior, tornar natural e comum o uso de drogas. Aqui e ali aparece alguém exaltando o quanto a tal “cannabis” é inofensiva, posto que é “só uma planta”. Hoje muitos estudos mostram que a maconha não tem nada de inofensiva, fora todo o resto que vem no rastro de um vício.
Além disso, vários símbolos e elementos do universo do narcotráfico tomaram de assalto — perdão pelo trocadilho infame — o que os jovens ouvem nas festas: músicas idolatrando explicitamente o mundo de ostentação que o crime proporciona, e isso toca nas baladas tanto das comunidades mais vulneráveis quanto nas caríssimas áreas vip das festas dos playboys.
Com o tempo, a droga, o vício e o crime vão perdendo aquele ar de algo extremamente ruim, para se tornarem algo banal, do cotidiano, e acaba parecendo “normal” e “nem tão ruim assim”, até se tornar algo desejável, um símbolo de status.
Esta é a tragédia que instalaram no cerne da sociedade brasileira como um programa de computador: uma mentalidade leniente com a tragédia que é o narcotráfico. Foi aos poucos, parecia só uma “música”, mas hoje sabemos que nunca foi só isso.