Um pit-bull é uma arma. Por mais dócil que seja com seus tutores, é da natureza feroz desse cachorro atacar. Está no DNA dele. O instinto avisa, ao menor sinal de perigo ou de ameaça, que é para morder. E a mordida de um pit-bull é uma das mais letais de todo o reino animal: são 42 dentes numa potência de quase 200 quilos nos braços, nas pernas ou no pescoço da vítima. Se for numa criança, quase sempre é fatal.
Não vou entrar no mérito de quem resolve criar um cão desses em sua casa. Cada um dentro de sua propriedade sabe de si e dos riscos que corre quando convive com uma fera incontrolável. Mas no momento em que um bicho desses está solto, sem focinheira, num espaço público, acho que como cidadã tenho o dever de exigir das autoridades uma providência.
Um menino de 11 anos foi atacado segunda-feira à tarde no bairro Rio Branco em Caxias do Sul. Se não fosse a presença por acaso — ou por intercessão divina — de um bombeiro civil no local do incidente, esse menino poderia estar morto. Ensanguentado e em choque, ao ser transportado pelo bombeiro até o hospital, o garoto pedia desesperado a quem lhe socorreu: “Não me deixa morrer”. Uma tarde nas férias de verão de uma criança não poderia terminar assim.
Cada vez que acontece algo trágico, há quem se pergunte “Como Deus pode deixar isso acontecer?”. Nessas horas, apenas lembro que Deus nos deu livre arbítrio confiando que a inteligência, que também nos foi dada, seria suficiente para termos bom senso e responsabilidade com nossos irmãos. Como filhos, até esperamos certa proteção divina, mas entre irmãos somos totalmente responsáveis por cuidarmos uns dos outros.
No momento em que alguém decide ter um pit-bull, essa pessoa assume o risco de que algo bem ruim aconteça a qualquer momento. Não tem como dar chance ao azar, como poderia ter acontecido na virada no ano na praia de Areias Brancas, Arroio do Sal. Eu mesma testemunhei um pit-bull marrom, de grande porte, circulando sem coleira nem focinheira pela praia e pela ciclovia, na altura da estátua de Iemanjá.
Minha irmã comentou comigo: “É por coisas assim que os anjos-da-guarda andam cansados”. Conversamos com os salva-vidas, conversamos com policiais civis, todos nos informaram que o animal solto deveria ser contido pela Secretaria do Meio-Ambiente da cidade. Como estamos em época de troca de prefeitos, nenhum servidor apareceu lá entre os dias 31 de dezembro e 1º de janeiro. E os banhistas — entre eles muitas crianças — ficaram à mercê dos humores instáveis de uma besta fera solta na areia.
Só não aconteceu nada porque o azar, dessa vez, não teve chance. Os anjos estavam atentos. Mas devem estar sim cansados de lidar com o mau uso do livre arbítrio pelos humanos. Quem era o dono do pit-bull perdido de Areias Brancas? Ninguém sabe. Mas se algo acontecesse, a culpa seria dele, não dos anjos.