Crises não são novidade no Brasil. Há, ao longo da história do país, diversos momentos de turbulência e queda da atividade econômica, com forte impacto no emprego. Mas a atribulação agora atravessada pelo Brasil tem um reflexo inédito no mercado de trabalho, não apenas pelo número recorde de pessoas que buscam colocação e não encontram, mas pela elevada quantidade de brasileiros que estão há muito tempo nessa condição. São 14,7 milhões de cidadãos atrás de um sustento para si e para sua família e, destes, cerca de 3,5 milhões estão nessa batalha há pelo menos dois anos, sem sucesso.
Há muitos trabalhadores desocupados por um longo período que estão desatualizados em relação às exigências atuais do mercado
O desemprego no trimestre encerrado em abril, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), ficou em 14,7%. Estável em relação à divulgação anterior. É positivo, ao menos, que a escalada da falta de trabalho tenha sido interrompida. Foi um problema agravado pela pandemia, que, neste momento, parece começar a ser estancado. Mas é preciso lembrar que, há uma década, o país vivia o pleno emprego e, a partir de 2014, a taxa dobrou, mostrando o grau de degradação da economia, causada por sucessivas conflagrações políticas que acabaram abalando a confiança dos agentes da economia, dos consumidores aos empresários.
O noticiário do dia a dia mostra que o país está longe de um momento tranquilo. Espera-se que a estabilidade, pela via democrática, seja alcançada a partir das eleições de 2022, visando a um período mais longo que não apenas recupere as perdas dos últimos anos, mas permita ao Brasil crescer, de fato, acompanhando o mundo. No curto prazo, cria-se a expectativa de que o avanço da vacinação permita um retorno de mais atividades, abrindo mais vagas, especialmente nos serviços. Mas é preciso ser realista. Um dos reflexos da pandemia foi um ganho brutal de produtividade das empresas, que buscaram fazer mais com menos. Assim, torna-se mais difícil recuperar celeremente os níveis de emprego observados no início da década passada. Ao mesmo tempo, o controle da epidemia vai significar mais pessoas voltando a procurar trabalho, pressionando a taxa de desemprego. Esta, aliás, poder ser a explicação para o fato de o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) continuar registrando resultado líquido positivo de vagas com carteira assinada, enquanto o desemprego não cede. Com os resultados de maio, o país soma 1,2 milhão de postos abertos e, o Estado, 82,1 mil.
Não há passe de mágica ou bala de prata. Mesmo que o PIB do país cresça 5% neste ano, será apenas uma recuperação do recuo do ano passado. E o avanço da economia, até agora, está mais ligado ao mercado externo do que à situação doméstica e ao consumo das famílias. Crescem mais os setores intensivos em capital e não em mão de obra. Há muitos trabalhadores desempregados por um longo período que estão desatualizados em relação às exigências atuais do mercado, principalmente em questões ligadas à tecnologia e à transformação de modelos de negócio.
Há receio, portanto, de que o desemprego brasileiro seja estrutural. A estas pessoas será preciso, de alguma forma, oferecer programas de qualificação, para que fiquem aptas a buscar uma vaga. Assim como será imprescindível uma atenção especial à educação, após os graves prejuízos ao aprendizado legados pelas escolas fechadas ao longo da crise sanitária. Ao lado das reformas estruturais que melhorem o ambiente de negócios e assegurem sustentabilidade fiscal, é de conciliação que o país precisa para voltar ao trilho do progresso e da conquista de um crescimento que beneficie todos os brasileiros.