Por Juliano Corbellini, cientista político. Professor convidado do Curso de Relações Internacionais da ESPM Porto Alegre
A cada crise política, vozes antipartidaristas se levantam no Brasil. Para elas, os partidos políticos seriam a origem dos males do país, sobretudo a corrupção e o clientelismo. Em tempos nos quais tanto se grita e pouco se ouve, essa é uma generalização fácil de ser difundida. Há décadas, os partidos são as "genis" da política nacional – uma enorme injustiça.
A combinação entre escravismo e patrimonialismo na formação do Estado, do sistema político e da sociedade e uma larga tradição autoritária de rupturas e golpes são a matriz de crises que se repetem de tempos em tempos, com atores diferentes, mas contornos parecidos. Desde a Independência, o Brasil teve oito sistemas partidários: Império, República Velha, Pós-Revolução de 30, o sistema de 1945, o bipartidarismo do regime militar, os cinco partidos da abertura, o sistema da Constituinte de 1988 e o atual. Não há como, num cenário de rupturas institucionais, esperar que os partidos sejam instituições sólidas.
O capítulo da democracia competitiva – na qual há oportunidade para os partidos demonstrarem funcionalidade, organizando o jogo eleitoral e a relação governo/oposição –é relativamente novo na história da República: 53 de 130 anos, se contarmos os períodos 1945-64 e de 1985 até hoje. Nesses dois períodos, os partidos foram decisivos ao liderar os processos de redemocratização. Foram os partidos que organizaram minimamente as preferências eleitorais brasileiras e conduziram mudanças legais e econômicas que modernizaram o país e melhoraram a vida das pessoas.
A era de polarização PT/PSDB fez coincidir a organização de uma inteligibilidade eleitoral com a alternância de dois governos que promoveram, por vias distintas, mudanças positivas. "Ah! Mas os eleitores votam em pessoas e não em partidos!", dizem os críticos. Sim. Aqui e em qualquer outro lugar. Os críticos ainda alegam que são a favor das chamadas candidaturas independentes e que os partidos já não detêm o monopólio da representação.
Discordo. Até hoje, não surgiu nenhuma outra organização, além dos partidos, com capacidade de fazer a democracia funcionar. Tanto que nossos dois últimos experimentos de governo outsider – Jânio Quadros e Fernando Collor –naufragaram.
Crises democráticas são sempre precedidas do fortalecimento de discursos antipartido. Na maior parte das vezes, porém, tudo não passa de conservadorismo mascarado.