Por Welber Barral, doutor em Direito Internacional (USP) e consultor em comércio internacional
Nas relações internacionais contemporâneas, o uso de sanções tem sido crescente, visto como alternativa preferível ao conflito militar. Por várias motivações, desde a defesa dos direitos humanos até reduzir a proliferação nuclear, sanções são utilizadas por potências para induzir o comportamento de determinados países. Mais recentemente, aos embargos comerciais se juntaram também outras formas de punição ao país-alvo, como congelamento de contas e propriedades, proibição de viagens de seus líderes ou punição a indivíduos ligados ao regime questionado.
Em matéria de sanções, os Estados Unidos têm a maior prática e a base legal mais sofisticada, que inclui até uma lista de pessoas suspeitas de ligação com terrorismo, e com quem as empresas norte-americanas são proibidas de ter negócios. A Europa também tem uma legislação abrangente, que foi importante à época do conflito na ex-Iugoslávia. O Brasil, em regra, segue estritamente as sanções quando aplicadas pelo Conselho de Segurança da ONU, que envolvem normalmente embargos comerciais ou à venda de armas para países em conflito.
O uso de sanções econômicas teve efetividade em situações políticas complexas, como induzir a África do Sul a acelerar o fim do apartheid, nos anos 1980. E seguramente essas sanções impactam a economia do país-alvo, tanto em sua tecnologia quanto suas exportações. Mas o empobrecimento da população nem sempre afeta o comportamento do governo ou do regime. O triste exemplo foram as sanções após a primeira guerra do Iraque, que destruíram a economia do país e abriram um canal escandaloso de corrupção na ONU, mas sem afetar o regime de Saddam Hussein. Outro fracasso histórico é o embargo econômico norte-americano contra Cuba, imposto por Kennedy e completando cinco décadas, sem levar à mudança do regime, que o utiliza como mecanismo de vitimização, sobretudo na América Latina.
Estas lições fazem questionar até que ponto sanções poderão ser efetivas para promover a redemocratização da Venezuela. Como passo inicial, qualquer analista deve reconhecer a complexidade da situação na Venezuela, e em consequência confessar a inutilidade de soluções simplistas. Para começar, a decadência do tecido social venezuelano não começou com o Chavismo, que sim se aproveitou do discurso populista para massas exploradas por décadas de cleptocracia. Daí se entende que parcela significativa da população, embebida de uma carga ideológica por duas décadas, ainda apoie Maduro.
Mesmo diante desta complexidade, há vivandeiras que ousam expressar o indizível: considerar uma intervenção armada na vizinhança sul-americana, algo que o Brasil conseguiu evitar desde o século XIX. Temos é que nos orgulhar deste feito, que inclusive está insculpido no art. 4º da Constituição brasileira.
Afastada a alternativa militar, o Grupo de Lima aponta corretamente para uma transição negociada para a democracia, que passa pelo enfraquecimento do atual regime. Neste cenário, sanções podem ter sua contribuição no processo – mas há que ser realista de que contribuem parcialmente, e que poderão implicar em maior sofrimento para o povo venezuelano nos longos meses à frente.