Acabo de ler tua mensagem, publicada em Zero Hora, sob o título "Ser professora". E me deu aquela vontade que conheço de escrever imediatamente, antes que algum aventureiro o faça. Em verdade, além de escritor, sou professor de Oficinas Literárias há 16 anos (mais de 60 livros de alunos publicados). Antes disso, ganhei experiência nessa arte em nossa UFRGS, e também na França e na Alemanha.
Ser assim aos trinta anos confirma minha teoria de que é preciso entregar logo o poder às novas gerações, antes que os mais velhos não deixem pedra sobre pedra
Mas não estou aqui para falar de mim e sim da tua maravilhosa mocidade. Da tua profissão de fé, explicada com a leveza de um pássaro em voo: A minha missão de vida é ensinar e auxiliar alunos, possibilitando transformações em suas vidas. Tudo está nessa frase, começando com a palavra missão.
Sabes, não é por acaso que nossos Sete Povos das Missões, simbolizados pelas ruínas de São Miguel Arcanjo, sejam o único Patrimônio da Humanidade tombado pela UNESCO no Rio Grande do Sul. Quando a ambição destruidora de Portugal e Espanha arrasou a República Guarani, nos anos mil e setecentos, não havia em suas 33 cidades um único analfabeto. E muitos sofreram tantas transformações em suas vidas, que se tornaram artistas da arquitetura, da escultura, da música; além de dominarem as técnicas mais atuais da agropecuária, da fundição de metais e, principalmente, da liderança social. Quando conto a meus alunos que Sepé Tiaraju, Corregedor de São Miguel, ou seja, Prefeito eleito pelo povo, falava e escrevia em guarani, espanhol e latim, fico ainda com mais vergonha dos nossos dirigentes atuais.
Parabéns pela tua coragem em não aceitar os conselhos de abandonar teus alunos para dedicar-te a outra profissão mais rentável. Quem pensa dessa maneira, não conhece a emoção que temos ao ver os olhos de um aluno brilharem depois de um ensinamento que os toca de verdade.
Quanto à greve, trata-se de um direito constitucional das democracias. Seria absurdo uma professora com a tua lucidez aceitar placidamente o parcelamento de salários já tão indignos. Aliás, recordo que, durante a ditadura, o saudoso Dom Paulo Evaristo Arns deu uma resposta definitiva a quem o acusava de agitador por apoiar uma greve legítima: "Se você conhece uma maneira mais pacífica de protestar, me diga. Deixar de ir ao trabalho, para quem ama trabalhar, pode ser um grande sacrifício".
Obrigado pelas palavras de sabedoria. Ser assim aos trinta anos confirma minha teoria de que é preciso entregar logo o poder às novas gerações, antes que os mais velhos não deixem pedra sobre pedra.