Foi notícia há poucos dias: ao escavar uma área do antigo campo de extermínio de Sobibor, na Polônia, por onde prisioneiras passavam a caminho da câmara de gás, pesquisadores encontraram um pingente muito similar ao usado por Anne Frank, a menina que, em seu diário, deu ao mundo um comovente relato da perseguição perpetrada pelos nazistas contra os judeus e virou símbolo da luta pela vida durante o Holocausto. A joia tem gravadas uma data de nascimento (3.7.1929), uma mensagem (mazal tov, "boa sorte", em hebraico) e uma cidade (Frankfurt, na Alemanha). Os pesquisadores descobriram que o pingente pertenceu a uma menina chamada Karoline Cohn, que nasceu na data inscrita no pingente e foi deportada de Frankfurt em 1941, quando tinha 12 anos.
Ao contrário de Anne, pouco se sabe sobre Karoline; tampouco está claro se elas se conheceram. E talvez isso não seja o mais relevante. Importante é sabermos que, além de serem judias, terem nascido no mesmo local e possuírem berloques parecidos, as duas foram vítimas de um mesmo maquinário de extermínio, movido por elementos até hoje muito presentes: o preconceito e o ódio contra o que é diferente. Ao trazer de volta uma personagem e uma história esquecidas, o achado em Sobibor nos faz perceber que, para cada relato bem conhecido sobre as monstruosidades do Holocausto, há muitos outros ocultos pelas camadas do tempo. O horror é sempre maior do que podemos conceber.
Além de terem usado um mesmo pingente de prata, Anne e Karoline compartilharam um mesmo pingente de dor, desesperança e morte. Compartilharam-no, aliás, com milhões de outras pessoas, que, além de judeus, incluem ciganos, deficientes físicos, homossexuais, testemunhas de Jeová, prisioneiros de guerra.
Para recordar todos estes, célebres ou anônimos, judeus ou não, o dia 27 de janeiro foi instituído pela ONU como Dia Internacional em Memória das Vítimas do Holocausto. É uma data que conclama à união dos que acreditam em uma sociedade regida pela paz e pela cooperação, avessa à intolerância e à violência que persistem em atos antissemitas, racistas, xenófobos, homofóbicos e segregacionistas de modo geral. Gravar em nosso espírito, como se grava em prata, as joias da compaixão e da humanidade: eis o único caminho para que a "boa sorte" possa brilhar para todos.