Confrontados com uma situação delicada, o polêmico fechamento de um empreendimento milionário dias após a sua abertura, em Porto Alegre, o jogador Felipe Melo e sua esposa, Roberta Nagel, optaram por partir ao ataque.
Ao responder para GaúchaZH sobre o encerramento das atividades da clínica médica popular Doutor Melo, o casal fez uma série de acusações contra o advogado, empresário e ex-dirigente do Inter Marcelo Domingues Freitas e Castro.
Possíveis delitos empresariais e divergências iriam muito além da Doutor Melo, estabelecimento que ficou aberto menos de um mês, após investimento R$ 3 milhões. Felipe e Roberta alegam terem sido enganados na Doutor Melo, descobrindo só posteriormente que o nome do jogador não constava como proprietário no contrato social. Castro era consultor, advogado e associado de Felipe Melo em diversos negócios, incluindo a clínica. Eles ainda têm vínculos familiares: as esposas do jogador e de Castro são primas.
Com o estouro público do caso da Doutor Melo, no qual funcionários foram dispensados sem justificativa e só foram chamados a receber os salários devidos depois de irem ao Ministério Público do Trabalho, Felipe Melo e Roberta dizem ter sido "ameaçados" por Castro via notificações extrajudiciais. Nestes documentos, o advogado teria enviado recados de que, caso detalhes sobre o fechamento da clínica se tornassem públicos, ele revelaria supostas condutas irregulares do atleta na condução de seu patrimônio.
Por escrito, Roberta citou outros dois negócios que ela e o marido tiveram com Castro, alegando terem sido prejudicados em ambos. Um deles era a Next Academy, empresa da qual Felipe Melo é acionista majoritário, cujo objetivo é aliar o desenvolvimento de atletas profissionais de futebol com a busca por bolsas de estudos nos Estados Unidos. A iniciativa tem 40 franquias no Brasil.
"Quanto à Next, onde toda a ruptura começou, o Marcelo, que é advogado, foi convidado por nós para organizar a empresa, e se tornou diretor remunerado, junto com Henrique Gershenson", diz trecho da manifestação de Roberta enviada ao Grupo de Investigação da RBS (GDI).
Gershenson é homem da confiança de Castro. Os dois são alvo das investigações do Ministério Público sobre supostos desvios na gestão do Inter entre 2015 e 2016. À época em que Castro era vice-presidente jurídico do Colorado, Gershenson teria recebido dinheiro de jogadores que concordaram em fazer acordos com o Inter na Justiça. Segundo as investigações, o núcleo jurídico do clube ofertava aos atletas propostas de acordo acima dos valores habituais, facilitando acertos rápidos entre as partes, desde que uma parcela voltasse para Castro. Gershenson seria o intermediário e teria recebido, por exemplo, pagamentos de R$ 138,7 mil da rescisão do zagueiro Danny Morais.
Roberta diz que, na condição de diretor remunerado, Castro contratou uma consultoria de sua propriedade, a Argos, para fazer auditoria na Next. Ou seja, ele teria usado um negócio seu para auditar outro no qual era executivo.
"A empresa (Next), que vem crescendo no mundo inteiro, passou por uma auditoria feita pela Argos, do próprio Marcelo, o que é ilegal. Nós não sabíamos que um processo tão importante dentro da empresa havia sido conduzido por uma única contadora, contratada por um valor absurdamente elevado, e que acabou mascarando um processo errado dentro da Next, sobre o qual, por enquanto, meus advogados e eu preferimos tratar como má gestão", diz a esposa do jogador.
Ela relatou, ainda, que Castro e Gershenson acabaram destituídos da direção da Next por decisão dos acionistas em assembleia.
Roberta traz nova empresa à discussão ao comentar outra possível lesão que ela e Felipe Melo teriam sofrido. Trata-se da "Montenegro", na qual teriam sido aconselhados por Castro a fazer investimentos de grande monta. Ela diz que, por meio de seus novos advogados, verificou que a Montenegro é vinculada a outra pessoa jurídica chamada Free Market Fomento Mercantil, esta de propriedade de João Aldomiro do Nascimento, também pessoa da confiança de Castro. Aldomiro é contador, trabalha na Argos, e consta como sócio majoritário da clínica Doutor Melo.
Ex-funcionários da clínica desconhecem Aldomiro e dizem que ele não fazia parte da rotina do negócio. No cotidiano, relatam, a gestão era tocada por Castro, que atuava como sócio investidor em conjunto com Felipe Melo.
"Começamos a investigar uma empresa na qual o Marcelo Castro nos indicou a fazer um investimento significativo. Falo de milhões. Em fevereiro deste ano, comecei a ter dificuldades para fazer contato com as pessoas desta empresa, de nome Montenegro. Deixava o Felipe fora disso, para não atrapalhar no dia a dia da profissão. Nosso dinheiro ainda não foi recuperado, mas nossos advogados já estão trabalhando para tomar as providências cíveis e criminais cabíveis contra todos os envolvidos. Por fim, a surpresa ingrata foi saber que o mesmo Aldomiro (sócio majoritário da Doutor Melo) era a pessoa que respondia pela Montenegro, por meio de uma outra empresa de nome Free Market Fomento Mercantil, da qual Aldomiro era o controlador. O quebra-cabeças começava a fazer sentido", escreveu Roberta.
O rompimento entre Felipe Melo e Castro, confrades de longa data, caminha agora para a disputa judicial.
Contraponto
O que diz Marcelo Castro
A reportagem entrou em contato e solicitou manifestação de Marcelo Domingues Freitas e Castro sobre as declarações de Roberta Nagel, mas ele não havia respondido até as 17h20min desta sexta-feira (15). Para que pudesse apresentar sua versão, foram enviadas a ele as declarações de Roberta a respeito da Next Academy, da Argos, da Montenegro e da Free Market Fomento Mercantil.
Na quinta-feira (14), ao comentar o fechamento da clínica Doutor Melo, Castro disse que o jogador Felipe Melo não constou como proprietário no contrato social, registrado na Junta Comercial do Rio Grande do Sul, por vontade própria.
"O sr. Felipe solicitou, por possuir outras empresas, que a mesma não figurasse em seu nome, neste ano de 2019. Necessário esclarecer que possuímos o respetivo contrato societário, firmado por ele e sua esposa", respondeu Castro.
Ele ainda disse que a clínica "encerrou suas atividades por decisão entre os sócios" e que todas as obrigações trabalhistas foram cumpridas junto aos ex-funcionários.