A cerca de dois meses do fim do convênio que viabiliza moradia gratuita, dezenas de venezuelanos enfrentam incertezas sobre onde seguirão vivendo a partir do fim de março. Em Canoas, Esteio e Cachoeirinha, os convênios para oferta de moradia terminam em 31 de março. Até agora, o poder público ainda não informou quais são os possíveis destinos dos venezuelanos que não têm condições de constituir residência própria.
A situação veio à tona na última semana, quando a prefeitura de Canoas disse ter sido informada pelo governo federal e pela Organização das Nações Unidas (ONU) de que o convênio para pagamento dos abrigos aos venezuelanos se encerraria em 31 de março e não seria renovado. Os refugiados foram trazidos ao Rio Grande do Sul através de um programa coordenado pelo governo federal, envolvendo o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur/ONU), as prefeituras e entidades de apoio.
Osmar Terra, ministro da Cidadania, procurado por GaúchaZH, não aceitou falar sobre o caso. Por meio de nota, o Ministério afirmou que cabe a cada município viabilizar o "abrigamento" dos venezuelanos. A pasta da Cidadania também aponta que "os prazos dos convênios foram informados previamente a todos os envolvidos" e que "as pessoas que foram interiorizadas também foram avisadas do prazo antes do embarque às cidades gaúchas". O Ministério finaliza o texto prometendo analisar "medidas para acolhimento dos venezuelanos, caso precisem de ajuda do Estado".
Cachoeirinha afirmou que precisa de mais recursos
Em Cachoeirinha, haveria possibilidade de renovação do convênio para acolhimento de mais venezuelanos. Contudo, o município alegou à ONU que precisaria de mais recursos para manter a parceria que viabiliza moradia e alimentação aos refugiados.
— Eles nos procuraram para que a gente abrisse espaço para mais pessoas. Só que, devido às dificuldades financeiras, a gente colocou restrições. O município está de portas abertas, desde que eles deem apoio financeiro, além do que já está vindo de dinheiro para alimentação e aluguel, para contratação de algumas pessoas para o monitoramento dos venezuelanos — disse o secretário Valdir Matos, de Cidadania e Assistência Social de Cachoeirinha.
Segundo a prefeitura de Cachoeirinha, dos 80 refugiados que chegaram em setembro, 57 já conseguiram emprego e deixaram o abrigo, enquanto 23 seguem morando na hospedagem paga pela ONU. A prefeitura ainda estuda alternativas para o caso de, ao final do convênio com a ONU, haver venezuelanos desempregados precisando de moradia.
— Estamos estudando a possibilidade de colocá-los no albergue do município. E no albergue não está sobrando espaço, estamos sempre no limite. Mas, vai ser o jeito até eles arrumarem emprego. A nossa esperança é que até 30 de março não tem mais ninguém precisando de abrigo", disse o secretário.
Canoas busca "preços mais acessíveis" para moradias
Em Canoas, a reportagem de GaúchaZH visitou, na última semana, os dois albergues pagos pela ONU. Lá, os refugiados já foram avisados que devem sair em 31 de março, gerando preocupação e angústia entre os moradores. Há casos como a da venezuelana Jorleidis Thellis, de 25 anos, desempregada. Ela mora no abrigo com sua filha de cinco anos e teme acabar vivendo na rua com a criança.
Em nota emitida nesta quarta-feira (23), a prefeitura diz que "está buscando formas de auxiliar os venezuelanos a se recolocarem em residências individuais, que deverão ser custeadas pelos mesmos". No texto, a prefeitura não aponta nenhuma alternativa para os refugiados que não tenham onde morar. Segundo dados da prefeitura de Canoas, dos 305 venezuelanos que chegaram à cidade em setembro, apenas 29 conseguiram recursos próprios para deixar a moradia gratuita.
Ainda na semana passada, a secretária de Desenvolvimento Social de Canoas, Luísa Camargo, afirmou a GaúchaZH que a prefeitura está trabalhando junto aos venezuelanos na busca por moradias "com preços mais acessíveis". Nesta quarta (23), nenhuma autoridade de Canoas concedeu entrevista.
Em Esteio, onde nenhuma autoridade aceitou falar sobre o assunto, foram acolhidos 220 venezuelanos em setembro do ano passado — em dois abrigos pagos pela ONU. Segundo a prefeitura, apenas 35 já conseguiram a independência financeira e deixaram os espaços. Em nota, o prefeito Leonardo Pascoal, garante que "nenhum deles será abandonado ou entregue à própria sorte".
A Acnur/ONU foi procurada pela reportagem, mas não concedeu entrevistas, tampouco se manifestou por nota.
Em Chapada, apenas uma família no abrigo
O grupo de venezuelanos que foi encaminhado para Chapada vive o cenário mais positivo, até o momento. Dos 52 venezuelanos que chegaram ao município do Norte do Estado, apenas uma família, de oito pessoas, segue no abrigo oferecido pelo município. E, para melhorar, até sexta-feira (25), devem seguir, como as demais família, para uma moradia alugada. Chapada, que recebeu os venezuelanos com festa, através da prefeitura ajuda cada família que deixou o abrigo com um aluguel social de R$ 250.
— É, com certeza, um sucesso. Não somente a imigração, mas também a migração, porque temos migrantes de outros municípios vindo para cá por conta da oferta de emprego - diz o secretário Dariano Guth, de Assistência Social e Habitação.
Pelo mesmo programa de interiorização, realizado no final do governo de Michel Temer, há venezuelanos também em Viamão e Santo Antônio da Patrulha. Esses grupos chegaram em dezembro e ainda têm garantidos cinco meses de moradia. Em Porto Alegre, por sua vez, o convênio de hospedagem ocorre diretamente entre a ONU e a entidade Aldeias Infantis SOS, que garante que não deixará nenhuma família desassistida.