Cortes anunciados pela diretoria do Grupo CEEE para equilibrar as finanças, que devem fechar no vermelho nos próximos quatro anos, conforme a direção, desagradaram os 4,6 mil funcionários da empresa. O maior foco de insatisfação é a proposta de trocar as gratificações em dinheiro do Plano de Participação nos Resultados (PPR) por folgas ou ações.
Na manhã de segunda-feira, em assembleia geral, o Sindicato dos Eletricitários do Rio Grande do Sul (Senergisul) anunciou que recorrerá ao Tribunal Regional do Trabalho (TRT) para garantir a manutenção do PPR. Também pedirá que o TRT decida sobre o plano de cargos e salários. A categoria cogitava entrar em greve, mas recuou, ao menos neste momento.
O presidente do Senergisul, Danilo Garcia, diz que o PPR é inegociável. Pelos critérios da CEEE, o programa não depende - como sugere o nome - do desempenho da companhia. Quer dizer, um determinado valor é distribuído mesmo se não houver lucro, se a empresa e os funcionários atingem determinadas metas.
Neste ano, devido ao aperto nas finanças da companhia, a direção colegiada propôs substituir o dinheiro por folgas e ações. O valor base para cálculo é de R$ 4.250, caso os objetivos sejam cumpridos integralmente.
Garcia destaca que os funcionários não podem ser responsabilizados pelos malfeitos que debilitaram a CEEE nos últimos 20 anos, como revelou a reportagem de ZH no domingo. Sustenta que já se sacrificaram pela empresa, inclusive aceitando reduções salariais de até 25% ao ano na década de 1990.
Garcia assumiu o comando do sindicato com o afastamento de Antônio Barbedo, que dirigia o Senergisul desde 1975. Barbedo chegou a ser reeleito deputado estadual por três vezes graças aos votos dos eletricitários. Era a época em que o Senergisul influenciava nos rumos da CEEE e Barbedo tinha mais poder do que alguns dos diretores.
Atual presidente da companhia, Sérgio Souza Dias esclarece que não pretende eliminar o PPR. Mas pondera que as gratificações não têm como ser pagas enquanto a CEEE estiver enfrentando aperto na receita.
- Esperamos que os funcionários tenham compreensão. A empresa está numa situação bastante séria e precisa de ajuda neste momento - avisou o presidente.
As dificuldades da CEEE foram agravadas pela Medida Provisória 579, do governo federal, que ditou novas regras para antecipar as renovações das concessões no setor elétrico, as quais venceriam até 2017. Ao aceitar os termos, como outras empresas do país, a companhia gaúcha teve diminuição na receita. Essa redução foi necessária para que a conta da luz baixasse em torno de 20% aos consumidores.
No final do ano passado, o presidente da CEEE projetava redução de 30% a 60% no faturamento anual e avisava que a empresa passaria por uma "readequação bastante forte" para seguir operando. A CEEE está recebendo R$ 3,5 bilhões do governo de financiamentos internacionais, mas somente para investimentos e obras. Os recursos não podem ser usados para pagar dívidas ou funcionários.
Problemas em série
Irregularidades que lesaram a CEEE nos últimos 20 anos:
Dívida trabalhista: despesa chega a R$ 407 milhões.
Cabide de emprego: funcionário recebeu salários indevidos por 13 anos, segundo o Tribunal de Contas do Estado (TCE).
Horas extras: servidor bateu o recorde cobrando 169,4 horas extras, em janeiro de 2010. Um ano de plantão de sobreaviso de apenas um funcionário somou R$ 27,6 mil.
Viagens a mil: gastos dobraram nos últimos cinco anos.
Farra da gasolina: um funcionário apresentou a conta de um litro com preço de R$ 202. Abastecimentos suspeitos entre o fim de 2006 e o início de 2007 chegaram a R$ 134,5 mil.
Mecânica superfaturada: em 2007, surgiram indícios de fraude em consertos de picapes da CEEE em Pelotas.
Salário duplo: com a separação da empresa original em duas, diretores acumularam cargos de forma irregular, segundo análise prévia do TCE, entre 2006 e 2007.