Uma tela exposta no Museu Cívico do Ressurgimento, em Bolonha, na Itália, conteria as origens da bandeira do Rio Grande do Sul. A pintura, feita entre 1840-1849, serviria como comprovação da autoria da flâmula gaúcha. E o autor, conforme o professor Edison Hüttner, do Programa de Pós-Graduação em História da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), seria o italiano Tito Livio Zambeccari.
— Ele veio para o Rio Grande do Sul e fez o primeiro desenho em verde, amarelo e vermelho. Essa onda tricolor começou com ele e depois, por decreto oficial, foi a bandeira da República Rio-Grandense, que inspirou a atual bandeira gaúcha — explica.
De autor desconhecido, a pintura mostra o próprio Zambeccari sentado, em uniforme militar, calçando bota de garrão e manuseando o que seria o mapa da então província de São Pedro do Rio Grande do Sul.
Tudo indica que a bandeira do italiano foi usada quando Bento Gonçalves invadiu Porto Alegre, no dia 20 de setembro de 1835.
EDISON HÜTTNER
Professor da PUCRS
É possível ver na tela um lanceiro negro, com poncho e boleadeiras sobre um cavalo. O guerreiro carrega a adaga e segura uma lança do tipo cruzeta, comum nos tempos da Revolução Farroupilha (1835-1845). E o principal — as cores verde, amarelo e vermelho podem ser vistas no topo da lança.
— O Tito Livio morou em Porto Alegre e fez os primeiros mapas da cidade. Ele veio para o Rio Grande do Sul convidado para participar da Revolução Farroupilha — contextualiza Hüttner.
O pesquisador afirma que cruzou as informações da tela de Bolonha com outros materiais antigos que, em conjunto, comprovariam a autoria das origens da bandeira. O livro Notas ao Processo dos Farrapos, do autor Aurélio Porto, seria um deles.
Na obra, estaria o depoimento de revolucionários que testemunharam que Zambeccari seria o autor da bandeira republicana tricolor. E que o italiano a teria desenhado quando esteve em Buenos Aires, na Argentina. O pedido teria partido de Francisco Modesto Franco, comerciante e proprietário de um barco, que veio lutar junto às forças farroupilhas.
O autor Aurélio Porto escreveu o seguinte na grafia da época:
"Precioso subsidio histórico, sobre a bandeira de 35, fornece o testemunho de Manuel Lobo Ferreira Barreto. Esteve a bordo da Esquadra Nacional, desde 27 de julho até 3 de Agosto de 1836 e presenciou que os rebeldes por baixo da bandeira imperial que içavam, nos fortes de Itapuan, distendia, outra, encarnada, saudada tiros de peça, com bala, dirigidos à esquadrilha legal. Em outubro de 1835 estivera também em Buenos Aires. Hospedando-se em casa de um espanhol d. Carlos Maria Hiergo, êste lhe comunicara, que naquela cidade, antes da revolução de 20 de Setembro se havia preparado uma bandeira para a República dos Farrapos, e que esta bandeira tinha cido manda fazer por Francisco Modesto Franco, que encarregaro do plano da mesma e do emblema ao italiano Tito Livio Zambicari, o qual covidado por Franco, viera para Provincia, na propria embarcação daquele, denominada Bela Angélica.”
Ou seja, a bandeira gaúcha teria sido planejada e criada em Buenos Aires.
— Em 1833, o Tito Livio Zambeccari já veio no barco para Porto Alegre com essa bandeira — assegura o professor.
Outro material usado para comprovar a autoria da bandeira seria o livro Res Avita — O Idealismo Farrapo e Tempo Idos e Vividos, de Alfredo Varela. A obra mostraria a imagem da bandeira de Zambeccari, inclusive assinada por ele.
— Tudo indica que a bandeira do italiano foi usada quando Bento Gonçalves invadiu Porto Alegre, no dia 20 de setembro de 1835, iniciando a Revolução Farroupilha. Porque a bandeira oficial foi decretada apenas um ano depois — observa.
Conforme o professor, em 1836, quando foi proclamada a República Rio-Grandense, "apenas foi mudada a ordem das cores, colocando o vermelho no meio. Na pintura, está a bandeira de Zambeccari", conclui.
Por sua vez, todos os brasões de armas republicanos foram idealizados na bandeira a partir do decreto de 1836.
Quem foi Tito Livio Zambeccari
O italiano Tito Livio Zambeccari nasceu em 1802 na cidade de Bolonha. Foi cientista, naturalista, maçom carbonário e foragido italiano. Em 1826, chegou em Montevidéu, no Uruguai, onde participou da luta dos uruguaios por sua independência.
Em 1829, foi para Buenos Aires, onde apoiou os portenhos unitaristas, que defendiam um governo liberal. A luta era contra Juan Manuel de Rosas, que, em 1828, havia se proclamado governador de Buenos Aires como chefe do Partido Federalista.
Em 1833, o italiano partiu de barco de Buenos Aires em direção a Porto Alegre. Foi preso na Batalha do Fanta, em Triunfo, em 1836, juntamente com o líderes farroupilhas Bento Gonçalves e Onofre Pires. Os prisioneiros foram conduzidos de barco até prisão no Rio de Janeiro. Dessa maneira, o italiano não participou do decreto que criou a bandeira da República Rio-Grandense em 12 de novembro de 1836.
Em 1839, o bolonhês foi anistiado pelo Império do Brasil com o compromisso de não voltar ao território brasileiro. No mesmo ano, regressou para a Europa. Fixou residência em Bolonha em 1841. Morreu no ano posterior.
Exposição
A exposição com as conclusões do grupo de estudo pode ser visitada gratuitamente de segunda à sexta-feira, das 8h30min às 18h, em uma sala do andar térreo da Escola de Comunicação, Artes e Design (Famecos), na PUCRS. Nos painéis é possível ver a reprodução da tela existente no museu de Bolonha.
Depois, haverá exibição do material nas cidades de Alegrete, Camaquã, São José do Norte e Piratini. De junho a setembro de 2025, a exposição será realizada em Bolonha, mas com todo conteúdo traduzido para o italiano.