Com base em minha prática e pesquisa, sei que, em geral, a ioga faz bem. Dobrar-se, esticar-se e respirar fundo pode renovar, acalmar, curar, fortalecer, melhorar o humor, diminuir o risco de doença cardíaca, aumentar a flexibilidade e o equilíbrio, reverter os efeitos da idade e melhorar a vida sexual. Em resumo, os benefícios são conhecidos por todos, ao passo que os perigos costumam ser raros e poucos.
Ainda assim, no ano passado, depois que meu livro sobre ioga foi publicado, cartas enviadas por uns caras que se machucaram me levaram a ver que a prática, apesar de seus benefícios, estava ferindo mais um grupo do que o outro. Para minha surpresa, relatórios de emergências médicas mostram que, proporcionalmente, homens se machucam mais que as mulheres e sofrem danos muito piores, incluindo fraturas e deslocamentos, além de ferimentos graves nas costas.
>> Leia reportagem sobre o livro do repórter do New York Times e publicado no Donna na ocasião de seu lançamento
Isso faz sentido. As mulheres são conhecidas por serem muito mais flexíveis que os homens. Segundo professores de ioga, os machões usam demais os músculos para se colocarem em posições difíceis e acabam se machucando. Os números eram relativamente pequenos, mas grandes o bastante para argumentar que homens que praticam ioga devem ser mais cautelosos.
Este ano, a imagem da superioridade feminina começou a desaparecer quando uma importante professora de ioga do Havaí me escreveu sobre uma ameaça pouco conhecida entre as mulheres. Michaelle Edwards contou que a elasticidade feminina se tornou uma desvantagem quando posições extremas passaram a causar danos em seus quadris. Ao longo do tempo, o estresse crônico pode se transformar em uma dor excruciante e, em alguns casos, levar a cirurgias de emergência para reparar o quadril. Edwards me enviou uma cópia de seu livro, o YogAlign (IogAlinhamento, em tradução livre). O livro descreve a dor que a autora sentiu nos quadris durante muito tempo e como ela resolveu o problema desenvolvendo um estilo mais suave de ioga.
Seu alerta contradiz muitos livros, artigos e vídeos que mostram as posições extremas da ioga como uma forma inteligente de combater a degeneração articular.
Por isso, eu não prestei atenção a seu alerta. Entretanto, depois de algum tempo, resolvi fazer umas ligações.
Para minha surpresa, alguns dos maiores cirurgiões do país declararam que o problema é real - tão real que centenas de mulheres que praticavam ioga estavam aparecendo nos consultórios com dores insuportáveis e sendo submetidas a operações caras, chegando até mesmo a substituir a bacia.
- A incidência de lesões é relativamente alta - diz Jon Hyman, ortopedista de Atlanta. - As pessoas não chegam aqui dizendo que estavam praticando Zumba ou tai chi. Porém, ioga é bem comum.
Hyman contou que seus pacientes com lesões causadas na ioga geralmente são mulheres de meia idade, acrescentando que recebe em torno de 10 pessoas por mês com esse tipo de problema - ou algo em torno de cem ao ano.
- As pessoas precisam ficar cientes disso. Se elas praticam ioga e sentem dores no quadril, não é bom ignorar - afirma.
Bryan T. Kelly, ortopedista do Hospital de Cirurgias Especiais em Nova York concordou com o alerta, afirmando que as posições da ioga são conhecidas por colocar o quadril em situações extremas.
- Se elas forem feitas sem o conhecimento das limitações mecânicas das juntas, isso pode causar problemas - revelou em uma entrevista.
O mesmo tipo de dano, acrescentou Kelly, pode afetar dançarinos que fazem movimentos exagerados com as pernas. Todos os anos, afirmou, entre 50 e 75 pacientes que dançam ou praticam ioga precisaram ser operados. O médico acrescentou que a maior parte eram mulheres.
Curiosa sobre a história por trás disso, descobri que investigadores médicos da Suíça rastrearam a origem dos problemas no quadril há mais de uma década. A artrite geralmente é ligada à idade avançada, mas eles descobriram que ela também pode afetar pessoas jovens e ativas.
Os quadris das mulheres se revelaram especialmente vulneráveis. Por sua natureza, a região pélvica é responsável por um conjunto incomumente grande de movimentos nas juntas, o que pode aumentar não apenas sua eficiência na ioga, mas também os riscos que você corre. Os investigadores descobriram que movimentos extremos com as pernas podem levar os ossos do quadril a se chocarem repetidamente. Ao longo do tempo, isso pode causar danos à cartilagem, inflamações, dores e artrites graves. Eles chamam isso de Invasão femoroacetabular - ou FAI, na sigla médica. O nome se refere à recorrência com que o colo do fêmur gira perto demais do acetábulo - onde o fêmur e o quadril se unem - levando a cabeça do osso a se chocar contra o quadril.
O principal investigador médico envolvido no estudo foi Reinhold Ganz, ortopedista da Universidade de Berna, na Suíça. Entre 2001 e 2008, sua equipe publicou diversos estudos. O de 2008 destaca que mulheres com idades entre 30 e 40 anos cujas atividades geram "uma grande demanda de movimentos" costumam danificar com maior frequência o quadril. O estudo citava especificamente a ioga.
A descoberta foi bastante divulgada e eu soube que centenas de ortopedistas no Mediterrâneo assistiram uma conferência em 2010 que ligava a FAI às mulheres de meia idade que praticam ioga.
Michael J. Taunton, ortopedista da Clínica Mayo, me contou que a primeira vez que ouviu falar desse perigo foi há cinco anos e que atualmente ele realiza entre 10 e 15 cirurgias no quadril em pessoas que fazem ioga por ano. Cerca de 90 por cento são mulheres, acrescentou.
Stuart B. Kahn, médico de reabilitação do Centro Médico Beth Israel, em Nova York, afirmou que a FAI "se tornou um assunto cada vez mais comum, à medida que aprendemos mais sobre o que causa dores nos quadris e a osteoartrite". O médico contou que boa parte das causas ainda é desconhecida.
Lesões nos quadris, por exemplo, possuem causas complexas. Além da ioga, alguns fatores que podem contribuir são o desalinhamento dos ossos, o excesso de peso e pequenas deformidades nas juntas que mudam de pessoa para pessoa. Pesquisadores especializados em quadris estão explorando esses fatores, mas as variações tornam difícil prever quem corre mais riscos.
Outro problema é que a ioga provavelmente ajuda milhões de pessoas a lidarem com a artrite, que pode afetar não apenas os quadris, mas também os dedos, joelhos e ombros. Há muito tempo os cientistas afirmam que os movimentos da ioga podem ajudar a combater as inflamações.
Além disso, formas de ioga mais gentis provavelmente ajudam os quadris. Porém, conforme Taunton colocou, as posições da ioga podem se tornar "uma coisa boa em excesso".
Edwards, a professora de ioga do Havaí, afirmou que deseja que os praticantes se tornem cautelosos quando fazem posições como Paschimottanasana, conhecido como a postura da pinça, o Uttanasana, a postura de estiramento intenso de um lado, e o Anjaneyasana, a arremetida para frente - movimentos que podem forçar o colo do fêmur para dentro do quadril.
Recentemente, ela divulgou seu alerta no Elephant Journal, uma revista de ioga online. Se as mulheres sentem o quadril quando caminham, ou dores intensas quando fazem posturas como a posição do triângulo, afirmou Edwards, "talvez seja bom tomar cuidado".
Os ortopedistas concordam que as mulheres que moderam a prática provavelmente evitam o surgimento do problema.
Infelizmente, professores de ioga costumam encorajar seus alunos a "superar a dor", Isso não é muito inteligente, já que a dor é a forma que a natureza tem de nos avisar que algo está errado.
É melhor praticar ioga com moderação e escutar o corpo com atenção. Afinal de contas, esse templo é nosso melhor professor.
Elasticidade feminina em desvantagem
Posições extremas de ioga podem causar danos irreversíveis
Mulheres que praticam ioga aparecem nos consultórios com dores insuportáveis e são submetidas a cirurgias de substituição da bacia
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